Sexta-feira, 01.03.13

Há poucas pessoas assim. Dadas, boas, motivo sincero da nossa querença. O Mário Cordeiro é assim. Um Amigo, daqueles onde a palavra tem de ser maiúscula. O convite que ele me fez para estar presente na apresentação do seu novo livro é, também por isso, uma honra como poucas. Espero não o desiludir com a minha intervenção. E poder falar da paternidade a partir daquilo que é mais importante: a peste que me sorri os dias.



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Quarta-feira, 20.02.13

Nada como regressar à Rua da Castela com esta actuação ao vivo do "Sr. Red House Painters", o "american nabe" Mark Kozelek. Não sei a data da dita cuja, mas terá sido há relativamente pouco tempo no talk show do Jimmy Fallon. Os pretos que o acompanham pertecem aos The Roots e conseguem abrilhantar aindamais a festa.

"Mistress" foi editada no álbum a que se convencionou chamar "The Rollercoster Album" em 1993. Há 20 anos, portanto. No mesmo álbum, além da versão semelhante à que aqui deixo, há também uma seminal ao piano, onde a obsessão de Kozelek é levada ao limite.

Tive o prazer de conhecer Mark Kozelek, de, nas Quasi, lhe editar os versos que escreveu. Chamou-se "Noites de Atropelo", tradução do Rui Lage de "Nights of Passed Over". O Vasco Gato deu-nos a honra de traduzir os versos. Foi há mais de dez anos. Ele veio cá lançar o livro, que só alguns anos depois conheceu edição inglesa. E contou-me como o álbum que lhe deu fama foi produzido com um laivos de obsessão. De como levou ao limite cada acorde, cada som de piano dessa linda versão.

"Mistress" sempre foi a mais bonita música de desamor que alguma vez ouvi. O Kozelek tem esse condão, o de mandar à merda as namoradas com uma beleza inexcedível. Basta ouvir "Grace Cathedral Park" e os duros versos que a compõem. E ainda me confidenciou que a sua namorada na altura não gostou muito deles. Pudera: "we walked down the hill, I feel the coming on of the fading sun and i know for sure that you'll never be the one". O mesmo se poderia dizer da "Katy Song", embora num formato relativamente diferente. A Katy voltou, depois. Só que eles não foram felizes para sempre, claro. Mas a música já existia e a Katy ficou para a eternidade a partir para Londres depois de um romance de Verão: "you've got some kind of family there to turn to and that's more than i could ever give you".

 

 

 



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Quinta-feira, 19.05.11


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Terça-feira, 10.05.11

Por várias ordens de razões - a principal sendo que do iPhone não consigo (ainda, espero...) colocar posts no blogue - tenho actualizado apenas o facebook. Escusado será dizer que isto é uma falta enorme de respeito para as 17 pessoas que têm diariamente acedido ao blogue, das quais 10 não são minhas amigas no facebook e 8 dessas 10 não são minhas amigas de todo e vêm aqui cuscar para me cascar logo que possam. Assim, prometo a todos os 17 ser mais assíduo nesta Rua da Castela. É que tenho o terrível hábito de enquanto estou a trabalhar estar a trabalhar e não abrir sequer um blogue, quanto mais o meu; e quando chego a casa a vontade de ligar o computador é mais do que pouca. Mas hoje liguei. Quis colocar a Bed of Roses dos Bon Jovi no iTunes, o que me pareceu motivo suficiente - dado o seu grau de importância - para o ligar.

Aproveito para dizer que sou cronista na Tentações, a nova revista oferecida com a Sábado. A crónica desta semana chama-se O Quarteto Fantástico e versa (adoro esta palavra) a locução e comentários dos jogos da Liga Europa na SIC. A da próxima semana chamar-se-á Uma Questão de Língua e versará outro assunto que deixo para que descubram na quinta-feira. O editor da revista teve a ideia de me colocar sempre (literalmente) dentro do tema do ponto de vista fotográfico, pelo que para mim a quinta-feira passou agora a ser um dia daqueles em que posso abrir mais uma carteira de cromos e ver o que saiu. Além que tive, dois dias antes de fazer 34 anos, uma sessão fotográfica excelente onde me deixaram partir à marretada e à picareta um LCD estragado. O que vêem na crónica desta semana, no para baixo, não é photoshop: antes da marreta já lhe tinha dado com a picareta. Foi uma das melhores prendas de anos que alguém me deu e a Sábado nem sequer sabia que eu fazia anos. Estas é que são as melhores.

Como gosto de contaminar tudo com poesia, por baixo da Mira Técnica surgirão sempre alguns versos de poetas portugueses nossos contemporâneos. Comecei com o Rui Pires Cabral. Quinta podem ver quem será o escolhido e assim ter mais um cromo para tirar da carteira, para além do para cima, para baixo e, claro, do tema da crónica propriamente dito.

Espero que vos agrade tanto ler os textos como me tem agradado a mim escrevê-los. Acreditem: tem sido um gosto!



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Quarta-feira, 20.04.11

Imperdível



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Terça-feira, 19.04.11

Nunca votei no PPD/PSD. Só me abstive uma vez, nas últimas presidenciais. Nunca votei PCP. Votei Bloco de Esquerda há uns anos largos, quando o discurso de Francisco Louçã ainda me fazia algum sentido. Dou de barato que talvez na altura já não fizesse sentido a muitas pessoas. Era jovem, era irreverente, parecia-me que sim. Neste momento, em que vejo no BE um partido sem qualquer comprometimento, envergonho-me de ter contribuído, na altura, para que crescesse. Mas enfim, vive-se e aprende-se. Nunca votei CDS. O que quer dizer que em 16 anos de eleitor, votei uma única vez BE e nas restantes vezes PS. No começo, era obrigatório, como se devesse seguir as pisadas do meu pai. Ele tinha morrido tinha em 17 anos e era evidente que votava PS. Hoje, não sei. Mas não o imagino a aceitar José Sócrates.

Para as legislativas de 5 de Junho estou nos indecisos. Eu, que nunca tive indecisões quanto aos votos. E a indecisão é só uma: ou voto PPD/PSD (eu gosto do PPD/PSD mais do que do PSD - faz-me lembrar o Santana Lopes sempre que escrevo, o que só permite uma enorme gargalhada quando pensámos que já foi Primeiro-Ministro deste país), ou voto PPD/PSD, dizia, ou não voto em ninguém. Não concebo votar em partidos do "quanto pior, melhor", que nem sequer reúnem com o FMI porque isso poderia mostrar algum comprometimento. Não concebo votar CDS, o Paulo Portas não me inspira a mínima confiança política e está longe dos meus ideiais políticos. E não concebo votar neste PS, onde um homem chamado José Sócrates anda perdido no meio do nevoeiro há anos. Quando chegou, há seis, tentou. Não conseguindo, desistiu. Há dois anos, Manuela Ferreira Leite não me parecia possível. Uma cavaquista que só tinha sido Ministra da Educação no fim do reinado, que tinha sido uma Ministra das Finanças de Durão Barroso sofrível, com todos os trejeitos de põe aqui e tira ali para enganar os défices. E nessa altura ainda pensei que Sócrates lá ia. Que novamente reforçado, ia tentar. Enganei-me. Agora não me engano: por muito que me custe não votar em Francisco Assis, por exemplo, que representa um PS que considero.

Resta-me, por isso, o PPD/PSD. Há uns meses era mais claro que Passos Coelho mereceria um voto. Depois de telefonemas, de Nobres, de tantos tiros no pé, já não me é claro. Passos Coelho encaminha-me para a abstenção. Espero para ver. Tem um mês e meio para me fazer caminhar para o PPD/PSD pela primeira vez. O Francisco José Viegas ser cabeça de lista por Bragança já ajudou. Espero que, eleito deputado como será, seja com o PPD/PSD no governo ou o senhor nórdico de olhos azuis a mandar no país, uma voz dos livros, da leitura, da literacia. E que possa vir a ser um óptimo Secretário de Estado da Cultura (que o Ministro da Cultura não existirá). Mais: que possa influenciar, na secretaria de Estado ou como deputado, o melhor possível esse ministério com o nome errado e que se chama da Educação. É que educar, para mim, é em casa. Porque não Ministério do Ensino? Desejo-lhe, pessoalmente, o melhor. E que possa fazer por mim a única coisa que me faria um dia pensar em sentar-me naquele hemiciclo: bater palmas e dizer bem alto Muito bem! Muito bem!



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Segunda-feira, 18.04.11



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Sábado, 16.04.11

Há três anos, durante as férias, traduzi o Funeral Blues, do Auden, e coloquei-o na Rua da Castela. Passados três anos, e depois de tentar escolher a melhor palavra possível para cada verso, ficou assim. Esta é a minha leitura do poema, bem mais do que uma tradução, como se percebe.

 

Canção Triste

[Auden]

 

Parem os relógios, desliguem o telefone,

amordacem o cão com um osso enorme.

Calem os pianos e com um pequeno tambor

tragam o caixão, deixem chorar a dor.

 

Que os aviões se lamentem em círculos pelo céu

rabiscando nas nuvens: Ela Morreu.

Enlutem a nação no pescoço branco das pombas,

deixem os polícias usar as mais negras luvas.

 

Ela era o meu Norte, meu Sul, meu Este e Oeste,

a minha féria e o meu Domingo de descanso.

O meu dia, a minha noite, a minha fala e canção;

pensei que o amor durava para sempre – não.

 

As estrelas não são queridas, já: desliguem-nas.

Arquivem a lua e retirem o sol.

Despejem o mar e varram a terra,

porque nada, agora, poderá vir a ser um dia melhor.



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Sexta-feira, 15.04.11

 



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Quarta-feira, 13.04.11

Ontem vi durante um bom bocado o debate moderado pelo António José Teixeira na SIC Notícias (tudo onde entra o António José Teixeira eu vejo pelo menos um bocado). E ontem estava em debate a economia, a moral e a política com o economista e filósofo Vitor Bento, o filósofo Francisco Assis e o "ele há-de ser licenciado em alguma coisa" Morais Sarmento.

Gostei do Vitor Bento, embora me pareça que repete vezes demais o mesmo argumento, sobre várias formas de explicação - basta uma. Gostei muito do Francisco Assis, embora me agrade pouco a pose de combate que tem neste momento (mas são as eleições, que queremos...). E achei um piadão que o Morais Sarmento tenha saído com esta tirada queria ele que muito filosófica quando se debatia a questão dos valores e da religião: "é verdade que um crente tem mais razão para ter mais valores do que um não crente porque acredita num prolongamento da vida". Cito de cor, claro. Mas era mais ou menos este o conceito. Proponho que leia A Desilusão de Deus de Richard Dawkins, edição Casa das Letras a 4,90 euros no Freeport. Ou então que espere uns meses pelo The Moral Landscape que a Babel editará em breve. Aí se explica bem a falácia deste raciocínio ligeiro e tentativamente filosófico. É que a moral e os valores, tendo uma grande associação à religião do ponto de vista histórico, não precisam dela para nada para serem uma boa moral e bons valores. Ninguém precisa de pensar que vai para o céu para agir bem. Basta agir bem.



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Segunda-feira, 11.04.11

Uma das coisas que me liga a Famalicão é este clube. A casa da minha avó fica a 300 metro do Campo dos Bargos. Sobe-se pela estrada onde me espalhei de bicicleta há dezanove anos (a descer - um mês no S. João...), passa-se a igreja e o cemitério de Calendário e é a casa da minha avó - aquela que ainda hoje chamo minha. Menino pequeno ia para o campo brincar, ver treinos, muitas vezes acompanhado do Nela (João Janela, vizinho da minha avó, meu avô por afinidade, pai do Carlos que tanto nos tem ajudado nestes meses). Menino pequeno e mais crescido, pelas duas e vinte, descia as escadas da casa do meu avô, com o meu pai e o meu irmão e ia chamar o Nela à casa em frente para irmos ver o Famalicão. Fim dos anos oitenta, o Famalicão na primeira divisão e eu a ir para os cativos onde percebi que a verdadeira vizinhança se faz na partilha de um lugar desde há muitos anos. Da fila D via o jogo, um pouco à esquerda da linha do meio campo. Abel Braga, Caccioli, Tanta, Lula, Leomir, Dane Kupresanin, Menad, Lopes, Rogério, Birigui e o Carlos, claro, director desportivo do Famalicão na altura. Gosto muito do clube, que depois da página mais triste (uma presença nos distritais da Associação de Futebol de Braga) está agora a um passo de subir à 2º divisão B. Eu sei, ainda longe da Primeira Liga. Mas diz-me o meu irmão que as dívidas estão a ser negociadas, que a coisa está a ser feita com cabeça. Gosto muito daquele Campo dos Bargos que um presidente da Câmara, num acto infeliz como presidente do clube, quis chamar Estádio 22 de Junho. Era o Estádio Municipal, mas para mim era e é como o meu avô lhe chama - o Campo dos Bargos. As bancadas estão velhas (aquela onde se gravam estes golos). A "bancada nova", que se vê em frente, está velha. O superior está como sempre esteve - relvado. Só me custou terem matado o Maracanã (o campo de treinos pelado, num canto do estádio) com o poste de iluminação. Mas lembro-me de lá ver jogos à noite, coisa nova e deslumbrante. Gosto muito do Futebol Clube de Famalicão e do Campo dos Bargos. Sou o sócio 527, o Gui o 1189. Ele não sabe, mas também gosta muito do Famalicão.

Fico por isso muito feliz quando ganhamos 3-1 ao Sousense. Parece pouco. Mas ganhar ao Sousense é o mesmo que ganhar um clube que esteve perto de ser mais um Salgueiros. E ver e ouvir no youtube este pequeno video é vibrar no mesmo sítio onde tantas vezes vi a bola entrar. Aqui fica.

 

 



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Domingo, 03.04.11

Estive fora de Portugal uma semana. Nesta semana morreu Edna Cardoso, a professora Edna. Quando as Quasi fecharam, foi a única pessoa que publicamente me apoiou. E nem sempre tive com ela a melhor relação. Lembrou-me que há muito mais o que aproxima as pessoas boas do que o que as separa. Agradeço-lhe ter possibilitado que um imberbe rapaz começasse a escrever umas imberbes crónicas no Cidade Hoje, há dezassete anos, quando era a directora do semanário. Tenho a certeza que iria gostar da novidade que irei dar dentro em breve a quem lê a Rua da Castela ou a minha página do facebook. Gostava muito de ter tido a oportunidade de estar presente no seu funeral. Tive pena de estar longe. Para a sua família, o meu maior abraço.



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Sexta-feira, 25.03.11

Leio no facebook do João que o António Barreto vai ao A Torto e a Direito no Sábado. Leio no Da Literatura que alguém falou no António Barreto para Primeiro-Ministro de um governo de iniciativa presidencial até ao final da legislatura. Leio que foi o Pedro Santana Lopes. Pronto, é assim que se queimam as pessoas. Uma das pessoas que mais admiro neste país, a ser recomendado pelo Santana Lopes. O António Barreto não merecia tal coisa.



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Segunda-feira, 21.03.11

Na conversa, consegui envergonhar-me na mesma proporção que ela foi maravilhosa. Por isso, tudo correu pelo melhor. Um beijinho para a Adriana, sempre hiperquanticamente fantástica.



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Domingo, 20.03.11

No Expresso desta semana, uma entrevista a José Luís Simões, administrador da maior empresa de transportes portuguesa. Notem estas respostas:

P: Que pensa das portagens para as SCUT?

R: Politicamente não a quero avaliar, mas é desastrosa para a economia do país, sobretudo para algumas regiões, e é insustentável para os operadores.

P: E se fossem para ligeiros?

R: Esses devem pagar, claro. As autoestradas foram feitas para ligeiros. Os preços das portagens não permitem que os pesados as utilizem. Só lá andam em situações de urgência e de risco.

P: Quer isso dizer que, quando houver pagamento nas SCUT, os pesados vão voltar à rede antiga?

R: Sempre que hover alternativa e for possível. Não temos preço para utilizar estradas com portagem.

Para melhor perceber o raciocínio, melhor ler a entrevista toda. Há mais pérolas maravilhosas.

Notem: aquilo que já se sabia, finalmente num jornal de grande tiragem - os nossos camiões andam nas estradas nacionais. Temos a maior rede viária de autoestradas da Europa; teremos, em breve, três ligações por autoestrada entre Lisboa e no Porto. E eles guiam pela N1. Há alguém nesta merda de país que possa fazer alguma coisa contra isto? Foda-se. Desisto.



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Quinta-feira, 17.03.11

Dia 21 de Março, pelas 18:30, estarei com Adriana Calcanhotto na Fnac do Chiado para uma conversa informal sobre o novíssimo O Micróbio do Samba. Disco feliz em toda a amplitude da palavra. Aqui fica, como na rádio, "o primeiro avanço": Eu Vivo a Sorrir.

 



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Terça-feira, 15.03.11

Uma das músicas mais espectaculares para se tocar na bateria. Esqueçam lá a letra, façam de conta que ela faz algum sentido. Só podia ter sido o nosso amigo Roger Taylor a escrevê-la, claro. O rapaz (já explico a denominação) tinha 34 anos quando tocou em Wembley, 1986. Eu faço 34 daqui a três semanas. Algo me diz que, além de já não marcar o golo no final da taça ao serviço do Famalicão, também já não vou tocar em Wembley... A velhice só desilude...

 



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Domingo, 13.03.11

Não fui à Avenida da Liberdade. E não fui porque a culpa não é deles. Porque eles, como bem dizem o João Pereira Coutinho e o Nuno Costa Santos aqui, não existem. Eles são sempre eles até que um ele entra para o círculo. E deste nunca fazem parte os mais próximos. Basta percebermos a exponenciação e o eles somos nós.

E não fui porque não acho que a geração a que pertenço esteja à rasca. O Henrique Raposo, de que aqui já dei conta, diz bem no Expresso desta semana. Acho que esta geração tem é de se desenrascar, o que é muito, mas mesmo muito diferente. Tentarei explicar.

No parlamento há cinco forças políticas. Dessas, só três são parte da solução - PS, PSD e CDS. As outras duas são parte do problema - PCP e BE (o PEV para mim não conta). Isto porque não se comprometem nem cedem em nada. E, meus caros, para se chegar a qualquer lado numa negociação é preciso mais do que impôr um modelo. Se o eleitorado só lhes dá 20% de votos é porque há 80% que com eles não concordam. E é estúpido - esta é a palavra - não haver qualquer tipo de negociação com os restantes 80 para resolver o problema. Assim, não solucionam - apenas esperam que, miraculosamente, os restantes 80% percebam que sempre estiveram errados e aumentem a sua votação para, quem sabe um dia, poderem então impor pela sua maioria eleitoral a solução que preconizam.

Digo isto porque na Avenida da Liberdade vi muito voluntarismo mas nenhum comprometimento. Como aquela história da prato de bacon com ovos: sim, a galinha contribuiu - mas o porco comprometeu-se. E na Avenida pareceu-me tudo muito tratem de nós que nós precisamos. Não, não precisam. E não, o tempo não volta para trás.

Primeiro a segunda frase: o tempo não volta para trás. Como bem diz o Alberto Gonçalves (ou o email que lhe enviaram e que ele teve a inteligência de citar) na crónica de hoje no DN, o tempo do trabalho dito não precário ou seguro (o que quer que isto queira dizer), acabou. Já foi altura em que alguém saía da faculdade e tinha emprego garantido na área onde estudou. Já foi altura em que uma pessoa ingressava numa fábrica e sabia que tudo ia correr bem até à reforma. E, pasme-se, por uma razão simples: porque a democracia e o acesso à educação chegou a Portugal há quase quarenta anos. Foi esta democracia que acabou com as corporações e as empresas do regime e fez com que A Boa Reguladora tivesse que começar a competir com o estrangeiro. Assim, teve de se adaptar ao mercado e, ironia das ironias, dispensar o pessoal que lá trabalhava. Porque já não tinha um regime que assegurava que o senhor António Augusto continuava a ser um empresário de sucesso e a possibilitar que meia cidade de Famalicão vivesse à custa da sua fábrica. Por outro lado, a educação para todos fez com que todos quisessem ser doutores e aquilo que era o sector primário e até secundário fossem completamente destruídos. Vivemos num país onde ser agricultor ou pescador ou empregado fabril ou afim era profissão para pessoas de segunda. Nunca permitiria um pai que investiu na educação do seu filho ou um filho que estudou investido dessa permissa parental trabalhar na pesca, na agricultura ou na indústria. Mesmo que ser agricultor já não seja só a enxada ou ser pescador só a rede.

Por isso, não há como. O tempo já não volta para trás. E se somos hoje um país desenvolvido, temos de nos ajustar a esta mudança de paradigma. A dita precaridade veio para ficar. E o recibo verde e o contrato a prazo é um exemplo acabado do futuro. Sim, há situações a melhorar no que diz respeito a alguns desses aspectos. Seja nos descontos para a segurança social, seja no IRS, seja no que for e que outros saberão bem melhor do que eu. Mas fico mais preocupado com a questão de diminuirem a indemnização por despedimento legal e a impossibilidade de se ter acesso a algum subsídio de desemprego antes de 450 dias de trabalho como contratado ou de os recibos verdes não contarem como trabalho passível de acesso a esse subsídio, do que a questão de entrar para a empresa ao fim de três contratos ou afins. Eu trocava de bom grado a entrada numa empresa por alguma segurança enquanto procuro outro emprego. É que depois de entrar estamos seguros, não estamos? Mas a empresa não. A empresa está pior, porque com mais responsabilidades e só se o, dito, trabalhador (eufemismo interessante) matar o, dito, empregador (notem as palavras) é que se pode libertar do primeiro. E é isso que traz precaridade - não haver flexibilidade laboral porque as pessoas ainda acham que vai ser trabalho para a vida e que podem esticar-se ao comprido quando entram para os quadros de uma empresa. Lembro, para reflexão, o exemplo os bolseiros de ciência em Portugal, que não passam recibo verde nem têm contrato a prazo. Não seria melhor para todos eles passarem recibo verde? É que podem estar com bolsas pós-doc até aos cinquenta anos e nunca tiveram uma declaração de IRS que lhes possibilite qualquer crédito.

O tempo não volta para trás e somos nós todos que nos temos de ajustar. Aqui entra o comprometimento, e a dois níveis. O primeiro, pessoal; o segundo, social. Comprometo-me pessoalmente em arranjar para a minha família as melhores condições possíveis de vida dentro de todas as áreas em que possa ser útil a ela. Escrevendo, editando, lendo, fazendo ginástica ritmica ou indo trabalhar como calceteiro. Comprometo-me pessoalmente a trabalhar. Seja aqui, ali ou acolá. Comprometo-me a tentar. Comprometo-me a não desistir. Comprometo-me a tentar ser competente na área que escolhi. E se nessa área não der - a ser competente na área em que não escolhi. A ser buliçoso -  a bulir. Comprometo-me a morrer, mas a morrer a tentar. A dar ao meu filho as melhor condições possíveis e engolir os sapos que tiver de engolir, mesmo que minha merda saia verde um dia. Porque trabalho é trabalho e conhaque é conhaque. Bom é, bom era, que se juntassem os dois. Já houve alturas em que foi um par perfeito. Hoje, a espaços, é um par perfeito e disse dou graças ao Deus em que não acredito. Mas labuto. E não me queixo de estar à rasca. Não. Desenrasco-me.

O segundo comprometimento é social. São precisas, se a internet não me engana, 5 000 assinaturas para criar um partido em Portugal. Se os três jovens que se dizem à rasca querem comprometer-se, criem-no. Estiveram 300 000 pessoas em manifestação. Desenrasquem-se. Mudem por dentro. Não há-de ser difícil. Ou melhor, até é. Isto porque nem todos são inteligentes em todas as áreas.  E isso de criar partidos e trabalhar nesse comprometimento obriga a uma certa dose de qualidades em algumas áreas que, talvez, nenhum dos três tenham. Mas desses 300 000 há-de haver quem saiba finanças, quem seja sociólogo, quem saiba economia, quem pense, quem pense, quem pense e ainda mais quem pense. Agora, sejam comprometidos com o país não contra a precaridade mas a favor do trabalho. Não contra eles, mas sendo eles. Não sendo parte do problema (como os 20% em cima) mas negociando para ser parte da solução. A democracia é cedência, não é imposição.

Numa frase: não estejam à rasca - desenrasquem-se.



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Sábado, 12.03.11

Ou é o mundo, ou sou eu. Mas depois de ver Sousa Tavares e Santana Lopes a debater há uns meses a situação política lado a lado no Jornal da Noite da SIC, hoje cabe-me referir que, espanto do espanto, concordo integralmente com a crónica do Henrique Raposo no Expresso. Talvez seja sinal de que o apocalipse se aproxima, não sei. Ou então que pessoas com visões algo distantes do modelo de Estado acabam por perceber que, entre modelos, o bom senso é sempre aquele que deve imperar.



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Quinta-feira, 10.03.11

A pedido de várias famílias, deixo-vos aqui a letra do video do último (esperamos todos) single do Roger Taylor, e cujo video podem ver uns posts mais abaixo. Ele toca todos os instrumentos, como se pode ver no video. A Marta acha que é porque ninguém quis tocar com ele nesta canção. E eu tendo muito a concordar com ela. Pois então, a, digamos, poesia:

 

God would weep
if he existed
and he saw what man can do to man
He'd think that we were twisted

His unblinking eye would blink and then
He'd say not in my name you don't
you stupid little men
With your arrogance and ignorance
you do it time and time again

I must be getting old
There's a fire and a fury
driven deep into my soul
It's the helplessness that comes
from being under your control
And everything is broken

We got the High Street full of holes
The High Street's full of holes
High Street's full of holes

Five million cameras stare at us
They treat us like we're fools
Our privacy is meaningless
We're suffocating by ten thousand rules

This Kingdom's not united
Just a complicated mess
Are we in Europe
Half in Europe
Not in Europe
We're soulless, spineless, directionless

I must be getting old
There's a fire and a fury
driven deep into my soul
It's the helplessness that comes
from being under your control
And everything is broken
Stylophone!
And everything is broken

Why send our young men out to die
in wars that we don't understand
Why on earth should we be meddling
in places like Afghanistan

The price is much too high
in terms of money or our precious men
Your reasons are mysterious
and quite beyond ken

I must be getting old
There's a fire and a fury
driven deep into my soul
It's the helplessness that comes
You even sold our gold
And everything is broken



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Quarta-feira, 09.03.11

O Porto tem neste momento 62 pontos. O Sporting, 36. Se fizermos uma regra de três simples, prevendo o que vai acontecer entre a jornada 22 e a 30 tendo em conta o que aconteceu até agora, o Porto terminará com 84 pontos e o Sporting com 49. Quero com isto dizer que se o Couceiro não se põe a pau, com um bocadinho de sorte (quer dizer...), o Sporting ainda acaba esta maravilhosa época de 2010/2011 com metade dos pontos do campeão. Mas isto não é o que mais me surpreende, sinceramente. O que mais me surpreende é que, sabendo que nas últimas dez temporadas, os leões ganharam tantos campeonatos nacionais como o Boavista, e nas últimas trinta mantiveram a mesma honrosa média de um por década, todos nós, sportinguistas, achemos que vamos lutar para o título na próxima época. Ah, homens de fé!



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Sexta-feira, 04.03.11

Chama-se Déjá Lu e é aqui. Uma excelente ideia para conseguir angariar receitas para a APPT21 - Associação Portuguesa de Portadores de Trissomia 21. Tive a honra de um convite para enviar um livro autografado para leilão. A Idónea Bibliotecária, num acto impensado, colocou-o em licitação por 14 euros, um valor considerável nas tempos de crise em que vivemos. Mas algumas almas caridosas, com toda a certeza ainda mais impensadamente, têm licitado o Todos os Dias. Vai em 18 euros. A dedicatória tem três páginas, é certo. Mas é bom aviso para o que se preparam para, digamos, ler. O meu grande medo era que a licitação começasse nos 14 e acabasse nos 3. Agradeço a todos os comentários e prometo uma coisa, do agrado de um dos comentadores: assim o queira a Idónea Bibliotecária e coloca-se em licitação um exemplar das Pulgas. Se é uma questão de nos podermos prestar à vergonha de ninguém querer um livro nosso, pelo menos que seja pelas melhores causas. 



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Quarta-feira, 02.03.11

O Roger Taylor é o maior do mundo. Quer dizer, nunca foi - mas é. Comecei a tocar bateria por causa do homem, é certo, mas tenho - sempre tive - a consciência que ele é bem capaz de ser o mais azeiteiro dos Queen. E isso é um feito assinalável para quem tinha como companheiros de aventura o mais azeiteiro vocalista que alguma vez existiu, um astrónomo que conseguiu manter o mesmo penteado 40 anos seguidos (and still counting...) e um baixista que... esse era só o baixista, como quase todos os baixistas, não conta.

Roger Meddows-Taylor: bom músico - certo; anos 70 bem vividos - certo; compôs a These are the Days of Our Lives, e isso já lhe dá alguns pontos. Claro que, como bem se nota pelo video em baixo, chegou lá por tentativa e erro: em 40 anos de prática lá conseguiria sempre compor alguma coisa de jeito.

Esta música, que aqui apresento, é capaz de ser a pior música alguma vez gravada. Depois de ouvir isto, fico com a sensação que o São Lágrimas do Zé Cabra é Mozart.

Roger Taylor compôs a música com a linda idade de 58 anos. É por estas e por outras que depois começamos a concordar com a idade de reforma dos gregos...

 

 

 

Mas para que não fiquem assim tão mal impressionados, ouçam lá a que importa. E não, não foi o Freddie Mercury quem compôs esta canção de despedida...

 

 



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Terça-feira, 01.03.11



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Domingo, 27.02.11

A Lei 11 das Leis do Jogo diz respeito ao fora-de-jogo. O post anterior falava de uma questão envolvendo o benefício dessa posição numa jogada seguinte, tendo como exemplo o segundo golo dos Rangers em Alvalade. No entretanto, perguntei a um sportinguista esclarecido, a um cronista da Bola, a um jornalista desportivo e a um ex-director técnico do Sporting a opinião. Este último - o Carlos Janela - teve a simpatia de me responder no Facebook. E todos me diziam que o lance foi limpo. Estou errado, pelos vistos.

O Carlos disse bem, ao telefone, o porquê disto: porque não há continuidade na acção para que esse benefício aconteça. Quer isto dizer que o jogador que recebe a bola do lado direito, ao tocar nela inicia uma nova jogada e por isso, digamos, "apaga" a posição irregular em que estavam os seus colegas de equipa. Retorqui a todos eles: mas isso não quer dizer que se pode deixar, por exemplo, o Cardozo ou o Falcão ou, vá lá, o Postiga na entrada da área à espera que o Coentrão, o Hulk e, vá lá, o João Pereira corra pelo seu corredor e passe para trás a bola? Quer. O Carlos foi mais longe e referiu que - como se vê tantas vezes - isso já acontece em livres da área lateral. É verdade. Mas não percebo como é que o Mourinho ainda não entendeu que sendo isso possível existe uma mudança enorme nas táctivas possíveis. Ou será que é como o outro: é proibido mas pode-se fazer. Ou, se quisermos, não é proibido mas ninguém faz com medo que seja.

Tenho a certeza no entanto de uma coisa: estas dúvidas sempre pertinentes são alimentadas pela própria FIFA. Quanta mais confusão, mais emoção, e mais facturação.



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Quinta-feira, 24.02.11

A melhor análise à equipa sportinguista pode ser lida aqui. Nada mais há a dizer. O Rogério Casanova já disse tudo.

Mas, dito isto, quero perguntar ao jornalista e aos comentadores da Sport Tv se sabem o que é Lei do Fora de-jogo (Lei 11 das Leis do Jogo). É que o segundo golo do Rangers é em fora-de-jogo claríssimo. E não, não estou a tentar ser irónico. A lei diz: "Um jogador na posição de fora-de-jogo só deve ser penalizado se, no momento em que a bola é tocada ou jogada por um colega de equipa, o jogador toma, na opinião do árbitro, parte activa do jogo: intervindo no jogo ou inlfuenciando um adversário ou tirando vantagem dessa posição".

Podem dizer que não. Certo: no passe para o lado direito, o jogador do Rangers não está fora-de-jogo. Certo: no passe rasteiro para a zona central os três (?) jogadores do Rangers que podiam, escolhendo por "pedra, tesoura, papel" quem iria encostar, também não estão, até porque o passe é para trás. Mas, na altura do primeiro passe, para o lado direito, estão estes três e talvez mais de metade da equipa do Rangers. Ora, isto é equivalente a estar à entrada da pequena área à espera que se faça a triangulação, sendo que na altura do último passe o jogador que fica lá especado não estaria em fora-de-jogo - bastaria o passe ser para trás. Se isto não é fora-de-jogo, é o quê? Não temos todos de saber isto. Somos só treinadores de bancada. Mas um jornalista que relata o jogo na televisão e os comentadores não deveriam saber?

Casanova: ajuda-me lá, tu que sabes tudo o que há a saber sobre o Sporting. Ou, no caso do Casanova não estar para isso, algum árbitro que seja inadvertidamente meu amigo no facebook?

Obrigado.

Jorge



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Segunda-feira, 21.02.11

Girls & Boys [Música Fixe]. Parklife [Páquelife]. The Universal [Música dos Violinos]. Song 2 [Woo Hoo]. Country House [Cãoti House]. Tender. Tracy Jacks. Estas duas últimas, ainda sem nome em criancês. Mas já não deve faltar muito. Pode-se, no entanto, desde já referir que nenhuma delas bate a Woo Hoo, claro.   



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Sexta-feira, 11.02.11

 

Hosni Mubarak foi falar às crianças de uma escola primária e, depois do seu discurso, ofereceu-se para um período de perguntas. Um rapazinho chamado Ramy levantou a mão e o Presidente egípcio interpelou-o: O que queres saber?
Ramy disse: Tenho quatro perguntas.
Primeira: por que é que o senhor é Presidente há 29 anos? Segunda: por que é que nunca nomeou um vice-presidente? Terceira: por que é que os seus dois filhos, Gamal e Alaa, controlam a economia e a política do país? Quarta: por que é que o Egipto é um Estado miseravelmente pobre e o senhor não faz nada? Nesse preciso momento, a campainha tocou e Mubarak informou as crianças que voltaria depois do intervalo. No regresso, retomou a conversa: Ok, em que ponto estávamos? Ah, já sei. Na sessão de perguntas. Alguém quer perguntar alguma coisa? Um outro rapazinho levantou a mão. Mubarak apontou para ele e pediu-lhe que se identificasse.
Eu sou Tamer, respondeu o menino.
E qual é a tua pergunta, Tamer?
Eu tenho seis perguntas.
Primeira: por que é que o senhor é Presidente há 29 anos? Segunda: por que é que nunca nomeou um vice-presidente? Terceira: por que é que os seus dois filhos, Gamal e Alaa, controlam a economia e política do país? Quarta: por que é que o Egipto é um Estado miseravelmente pobre e o senhor não faz nada? Quinta: por que é que a campainha tocou para intervalo 20 minutos antes do que é habitual? Sexta: o que é que o senhor fez ao Ramy? No Público.



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Quinta-feira, 10.02.11


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Quarta-feira, 09.02.11

Agora que a Blitz deste mês já saiu, fica o texto sobre Leonard Cohen que teve a honra de figurar no Retrovisor do mês passado. 

 

Ele está no meio de nós

Deus existe. Mesmo que o princípio de Occam’s Razor – que nos diz que a explicação mais simples tende a ser a mais correcta (“a pluralidade não deve ser usada sem necessidade”) – tenha de estar errado nesta matéria. Eu sei: é mais simples dizermos que Deus não existe e que é uma construção da mente humana do que dizer que Ele anda no meio de nós, sem provas que não sejam muito subjectivas ou baseadas num livro escrito há quase dois mil anos, livro esse acerca de um homem que alegadamente fez uns milagres, depois foi crucificado e ressuscitado pelo seu Pai.

E Deus existe, mesmo ao arrepio da leitura do magnífico livro A Desilusão de Deus (God’s Delusion, no original) do reconhecido e admirado cientista Richard Dawkins. Com o livro de Dawkins todas as dúvidas são dissipadas: quem era crente torna-se agnóstico, quem era agnóstico fica finalmente ateu. E isto mesmo aconteceu comigo. Agnóstico desde que comecei a pensar um bocadinho no assunto (depois da minha primeira namorada me ter dito “o problema não és tu, sou eu” e eu perceber que Deus deveria ter intercedido para com um milagre tratar do problema que pelos vistos era dela), tornei-me ateu desde que li essa bíblia dos tempos modernos e que, com argumentos inabaláveis, desconstrói a outra bíblia dizendo, “o problema és tu, não sou eu”.

Então, a pergunta impõe-se: se sou ateu, porque raio começo esta reflexão acerca da divindade com a frase “Deus existe”? Porque não há argumentos científicos que ganhem às experiências pessoais e às reflexões por elas motivadas.

Um dia houve em que vi Deus. Foi há uns anos, no Sá da Bandeira e no concerto dos Sigur Rós. Foi logo na primeira música, quando Jónsi cantava Vaka – a primeira música do álbum ( ). A certa altura há uma passagem de grau, como aquela que aconteceu dos antepassados dos chimpanzés para os dos humanos, e a música torna-se um pungente grito e exclamação. E foi aí, nessa altura, que Jónsi teve Deus a iluminar-lhe a face, numa luz vermelha e tão bela. Claro, os meus amigos disseram logo que era só a luz, mas eu queria acreditar em Deus. Acreditei em surdina interior até há dias. Agora posso confirmar que era mesmo Deus porque percebi que é na música que o encontramos sempre.

Existem três tipos de actuações musicais. A primeira, mais indexada à chamada música clássica, diz respeito ao concerto. Nesta categoria, os músicos costumam estar munidos por pautas e, na maior parte das vezes, tocam melhor ou quase tão bem do que o fazem na gravação do álbum. Até porque, também na maior parte das vezes, o álbum é uma gravação ao vivo feita em estúdio. Não há lugar ao improviso nem a falhas. A única coisa que a liga à próxima categoria é o maestro poder ser venezuelano e ter um cabelo mais parecido do que devia com o do vocalista dos Extreme.

A segunda categoria diz respeito ao espectáculo. Aqui se incluem praticamente todas as outras actuações ao vivo. Desde o stage diving de Mike Patton, vestido como se tivesse saído do Tudo Bons Rapazes do Scorcese, até aos saltos – agora já mais comedidos, claro – do Eddie Vedder, passando pelos “faz de conta que me estou a cortar” do Marilyn Manson (embora as garrafas de água bem cheias passassem rasantes ao técnico da munição…), pelos Kings of Convenience a chamar toda a gente para cima do palco ou pelo Rufus Wainwright a, em actuações diferentes, é certo, usar um vestido de noiva preto, fazer um karaoke onde obrigava o guitarrista de sessenta anos a vestir smoking e a dançar como se estivesse no West Side Story, cantar a última música do álbum Want Two,  Old Whore’s Diet vestido à fada madrinha ou, por fim, passar metade do tempo a contar histórias da vida dele. Isto é espectáculo. As músicas quase que em segundo plano, a sua qualidade de execução sempre muito mais baixa do que a gravação por pistas num estúdio, mas a beleza de percebermos que são experiências por isso mesmo únicas.

A terceira é a que verdadeiramente interessa para o argumento deste texto: a missa. Claro que desde há muitos anos que há músicos ou bandas que fazem dos seus espectáculos cerimónias quase religiosas (os Doors para os mais crescidos ou o Festival Panda para o meu filho), mas só há um músico que usa um missal e que, em tudo, se apresenta fazendo do seu, digamos, espectáculo (ou concerto, dada a ausência de um único erro), uma verdadeira missa. Esse homem chama-se Leonard Cohen.

A personagem traz logo com ela uma história que impõe tanto respeito como aquele que podemos (e devemos?) ter por quem caminhava por cima das águas, transformava água em vinho, ressuscitava pessoas de nome Lázaro ou via os pés lavados pela Madalena. Cohen tem naquele metro e meio de gente (pelos vistos talvez um e sessenta e tal) um passado e uma falta de coerência que nos faz pensar que todos devíamos admirar e seguir o seu exemplo. Começou poeta, movendo-se nos círculos literários da Montreal onde nasceu como se fosse mudar o mundo pela Palavra. Escreveu romances. Viveu muitos romances. Foi para Nova Iorque onde, no Chelsea Hotel, se perdeu nos meandros do hedonismo. Como pecador, absolveu-se e seguiu em linha directa para os ensinamentos do seu mestre zen, Roshi. Viveu num mosteiro budista durante alguns meses, a norte de Los Angeles mas bem no pico do Inverno, onde a neve queimava os pés de americanos (calçados com apenas com umas insuficientes sandálias) seguidores de um japonês e um alemão (“a vingança pela segunda grande guerra”, disse ele a certa altura). Foi-se embora. Mas voltou. E – certamente já no Verão – tornou-se monge. Com um pé-de-meia considerável, tanto motivado pelos seus concertos, como pelos seus álbuns, mas também e muito pelas versões que quase diariamente aparecem pelos mais estranhos executantes de músicas suas (sendo que Hallelujah é o maior exemplo – embora, tenha de ser dito, depois da de Jeff Buckley mais valem os restantes cançonetistas estarem quietinhos), pensou que com quase setenta anos tinha a reforma que merecia mas, mais do que isso, a vida dos seus familiares salvaguardada para o futuro. Poderia assim, dedicar-se à vida asceta que tinha escolhido.

Mas, como aquele que foi traído por trinta dinheiros, Cohen foi traído por alguns milhões de dólares. A sua manager e – claro está – em tempos fugaz interesse amoroso, tinha através de coisas tão complicadas como holdings, investimentos à Madoff ou afins, delapidado o seu pé-de-meia deixando-o com uns míseros 30 mil contos. Ele ainda pensou que com esse valor se governaria até ao final da vida. Mas, pelos vistos, as dívidas ao fisco já eram maiores do que isso. Hipotecou a casa, entregou ao processo aos advogados e fez-se à vida – ou, neste caso, literalmente à estrada.

Assim, com setenta e poucos anos iniciou uma digressão que já passou por Portugal três vezes e permitiu a edição de dois dvds e dois cds: Live at London e Songs From the Road. E é aqui, neste espectacular concerto, que nós vamos à missa.

Cohen entra em palco vestido de fato, coisa que não é surpreendente tendo em conta que o seu pai fazia fatos e ele nunca se conseguiu sentir bem de jeans. Fato e cartola. O palco tem os instrumentos colocados em cima de tapetes persas. Os músicos usam também a sua cartola. Os roadies usam cartola. As três lindíssimas meninas (Sharon Robinson e as Webb Sisters) parecem de tailleur como se estivessem ali para ajudar à missa (e estão). Mas isto é só o começo, aquilo com que se irá seguir a cerimónia.

Na primeira música, Cohen ajoelha-se à primeira fala. Fá-lo-á incontáveis vezes num gesto natural e aceite como evidente por quem vê. Depois segue todas as rotinas, como se lesse o seu missal: entre as músicas, as mesmas palavras em todos os concertos, o mesmo sorriso, a mesma conversa com o público. A certa altura fala de si, dos momentos mais complicados que passou durante a sua vida, dizendo de como, mesmo tendo estudado muita religião e filosofia, a felicidade continua a aparecer. Sem hedonismos, note-se. É uma felicidade ascética, verdadeira porque da alma. Noutra, e enquanto as meninas continuam o coro de Tower of Song, diz que percebeu qual o significado de tudo, que tem a resposta para a maior pergunta de todas. E que a dirá: tam tirám tirám tam tam. Depois há os solos de cada um dos músicos em que tira o chapéu, virando-se para eles e, no final, fazendo a devida vénia como se tivesse de agradecer aos sacerdotes que o acompanham. Quando inicia If it be your will e permite que as Webb Sisters a cantem, ele não sai do palco: antes fica de cartola colada ao peito a cantar, entre dentes, cada uma das falas. Quando canta Hallelujah ou quando canta I’m Your Man, The Future ou Everybody Knows, ele não muda em nada o discurso corporal, a prece, o ajoelhar. Cada música é um pedaço da voz de Deus que – mesmo parecendo (e só parecendo) poder não estar de encontro com a filosofia mais ascética – aí se enquadra na perfeição. E como também na nossa tradição judaico-cristã, onde a certa altura há o ofertório, Cohen cede ao público e oferece So Long, Marianne, tão datada nos anos 70 que parece que estamos por momentos a ouvir Demis Roussos. No final, entre saídas e entradas quase a caminhar sobre o ar, saltitando e dizendo que até aos 76 anos é possível ser mais do que um velho a debitar poemas, aparece finalmente na tela a Cruz: é um símbolo que junta os dois corações, parecendo a Estrela de David sem esquinas (Cohen é de ascendência judaica; para conhecer o símbolo basta ver o álbum Dear Heather, a edição portuguesa do Book of LongingLivro do Desejo – ou a nova e lindíssima edição americana do Book of Mercy). É este símbolo que nos informa: aqui está e foi a Palavra revelada.

Quando ia à missa com a minha avó, contava os quarenta e cinco minutos de duração quase em surdina, a ver se acabava rapidamente. Esta, de Leonard Cohen, tem três horas e parece que dura um fugaz momento.

Eu sei porquê. Porque, apesar de Dawkins, Deus existe e nós não podemos ver o Messias mais do que o permitido. E três horas, para um comum mortal, já valem para uma vida inteira. Sincerely, L. Cohen.  



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Terça-feira, 08.02.11


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Segunda-feira, 07.02.11

 



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Domingo, 06.02.11

 



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Sábado, 05.02.11

No youtube alguém fez um video para a Katy Song. Há muito tempo que a queria colocar aqui, mas não havia imagens para ela. Agora há. Não são fantásticas, mas pelo menos são passíveis de serem vistas. Ficam em baixo.

A Katy Song talvez seja a música a minha vida. Quer dizer, eu tenho muitas músicas da minha vida, mas esta tem algo de único e especial. Até porque tem histórias à sua volta que só a fazem mais maravilhosa.

A história oficial está contada na canção. Kozelek conheceu Katy em São Francisco, quando ela visitava a cidade. Viveram uma paixão daquelas muito adolescentes e de férias, já eram ambos crescidos mas com vontade de viverem paixões adolescentes e de férias. Ela voltou para Londres como tinha de voltar (I know tomorrow you will be somewhere in london, living with someone. You've got some kind of family there to turn to and that's more than i could ever give you). E ele escreveu esta música no dia da sua partida (tive na mão o papel onde está a primeira versão da letra - foi reproduzido no livro Noites de Atropelo, que tive a honra de editar nas Quasi), onde tudo é feito de saudade (Kozelek - talvez o maior amante de Caldo Verde depois da Ana - é português, acreditem).

Só que a história oficial termina assim mas a verdadeira história, que ouvi do próprio Mark (com quem tive a honra de privar como amigo - costumo dizer, com muita pretensão, que eu não sou amigo do Mark: eu zanguei-me com ele), é um bocadinho mais humana.

Quando Mark veio a Londres por causa do primeiro álbum (e já a Katy Song estava escrita), a paixão adolescente continuou como devia. E Katy voltou para São Francisco com ele. Infelizmente, as relações humanas não se compadecem com a arte e foi Kozelek, não Katy, quem disse já chega. Confidenciou-me que ela se tinha tornado algo que não conhecia, que a pessoa que estudava artes parecia alguém passivo com a vida (as paixões adolescentes e de férias costuma ter este fim). Disse-lhe adeus e ficou a música. Não se falaram nunca mais. Ou quase nunca mais. Apenas se voltaram a falar quando Katy - já casada e mãe de dois filhos, a viver julgo que noutra parte da California - soube que tinha cancro. Mark telefonou-me - ainda éramos amigos - dizendo-me da morte de Katy e de como tinha morrido a pessoa da vida dele. A música, afinal, estava certa. É Kozelek quem perde Katy. Infelizmente não para Londres, mas para sempre. A chance for calm, a hope for freedom, outlet from my cold solitary kingdom. By the forest of our spring stay, where you walked away. And left a bleeding part of me, empty and bothered, watching the water, quiet in the corner numb and falling through. Without you what does my life amount to?

Esta última pergunta é aquela que fazemos sempre que perdemos aquele ou aquela que mais amamos.
 



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A luz que se diz existir em Lisboa existe mesmo. Não há luz assim em mais sítio nenhum. Há qualquer coisa de único neste Inverno onde o Sol se espalha por um céu completamente limpo. Lembro Au Revoir Simone, banda sonora da terceira parte do Vou para Casa:

 

So let the sunshine, so let the sunshine

So let the sunshine, let it come.

To show us that tomorrow is eventual

We know it when the day is done

 

Ficam dois videos. O oficial e uma actuação ao vivo da mesma música. Tive a sorte de as ver e ouvir no Theatro Circo, em Braga, há anos. Ainda não sabia da luz de Lisboa como sei hoje. Mas já havia nas três meninas este brilho.

 

 



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Quinta-feira, 03.02.11

Domingo à noite. No São Jorge, em Lisboa. Perry Blake. Para quem, como eu, o conhece de cor - imperdível. Para quem, como tantos, o conhece quase que bem - imperdível. Para quem, como tantos, se lembra daquela canção no anúncio do Banif (i need you páparararam) - imperdível. Para quem, como outros, não o conhece de todo - imperdível.

Segundo soube por fontes seguras, vem com a guitarra do Glenn e um novo pianista. Já o vi ao vivo algumas vezes. Desde o TAGV, em Coimbra, até à Casa das Artes de Famalicão ou ao Theatro Circo de Braga passando pelo Santiago Alquimista. Sempre diferente, mas sempre igual - imperdível.

Fica aqui a versão despida de The Hunchback of San Francisco. Original no seu primeiro e homónimo álbum.

 



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Terça-feira, 01.02.11

Terá isto alguma coisa a ver com isto? Agora que é muito azar e uma péssima coincidência vir "a par" de uma personalidade como esta, é...



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Quinta-feira, 27.01.11


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Terça-feira, 25.01.11

Antes de ontem, por razões circunstanciais, foi a primeira vez desde que me conheço em que não acompanhei a "noite eleitoral". Por razões bem mais essenciais, foi a primeira vez que não votei. Uma delas é simples: não tinha em quem votar e não estive para ir votar em branco ou, como espero que o meu avô tenha feito, depois de uma conversa sobre o voto nulo, colar um autocolante do Faísca McQueen no boletim.

Mas também gostaria de ser politólogo e imagino que as trintas simpatiquíssimas e adoráveis pessoas que me visitam diariamente estejam à espera da minha sagaz opinião desde que as televisões anunciaram as primeiras projecções.

E ela é:

- Aníbal Cavaco Silva não fez nada. Ou se fez, ninguém tem nada com isso. É mais do que normal que não se pague a Sisa por esquecimento; é mais do que normal que se comprem acções a preço de saldo porque um amigo nos fez o jeito e nós achámos na altura que isso acabava por não chatear ninguém. Quer dizer: é mais que normal se não formos políticos. E Cavaco Silva diz que não é nem nunca foi político. Dito isto: quem somos nós para pôr em causa um jeito tão portuguê que um amigo lhe fez? Sim, poderíamos pôr isso em causa - como aconteceu com Sócrates e o inglês técnico ou o Freeport - se ele fosse político. Mas Cavaco, como se viu ontem, é tudo menos político. Um político saberia que, em democracia, às "insinuações", aos "ataque" e às "calúnias" se responde com documentos, explicações, verdade. E que depois das eleições, ainda para mais quando se ganha, isso já passou. Sim, como bem disse João Marcelino, era bom que se visse quem andou a "orquestrar" o que quer que fosse. Como o DN viu quem "orquestrou" (Fernando Lima) o caso das escutas de há uns meses. Ficou-lhe muito mal, a Cavaco Silva, aquele discurso ressabiado, vingativo e dorido. A ética não se diz, pratica-se. E se ele acha que a praticou, só tem de o demonstrar. 

- Manuel Alegre foi tudo menos inteligente no que diz respeito ao seu percurso nos últimos cinco anos. Aquilo que ele conseguiu em 2006 foi o voto de protesto de muitos dos portugueses (não o meu, que votei Soares). Desde a esquerda caviar até à direita marialva passando pelo centrão sardinha em lata ou iPod. O facto de, como é de conhecimento público, ele ter pouca paciência para reuniões, fez com que o Movimento Intervenção e Cidadadina, que tolerou que criassem, se esvaziasse sem a sua presença. Terá pensado que a melhor maneira de conseguir o que sempre quis desde 2006 com o mínimo esforço e ou as mínimas reuniões - a Presidência da República – seria "unir a esquerda". Ensaiou uma aproximação a Soares (basta ler a badana do livro que editou nas Edições Nelson de Matos), andou aos beijos com o PS e aos abraços com o Bloco. Soares - Alegre devia saber isso bem melhor do que todos - nunca esquece. E a vingança serviu-se fria e Nobre. Andar com dois namorados, ainda para mais quando um só gosta de sardinha em lata e o outro de caviar, não podia dar em coisa boa. Não deu. O candidato contra o sistema foi o candidato do sistema passado cinco anos. A desilusão foi tão grande quanta a felicidade de Sócrates que sabia que, se ele fosse para Belém, teria um problema gravíssimo em mãos. Cavaco, o institucionalista que só fará o governo cair se antes cair um meteorito daqueles que mataram os dinossauros em pleno Rossio; Alegre, o voluntarioso que chegou a dizer que o governo caía se se privatizasse a água.

- Fernando Nobre mostrou a Soares que se enganou. Duas vezes. Primeiro quando patrocinou em privado a sua candidatura. Depois quando não a patrocinou em público. A primeira porque Nobre 2011 é um Alegre 2006 mas em mau (eu sei, é difícil de imaginar...). Não tem qualquer tipo de experiência política e muita humanitária. Isto só poderia descambar no populismo apartidário e nem de esquerda nem de direita que o seu discurso sempre demonstrou (o candidato a presidente da república que esteve inscrito na Causa Real - mas nunca pagou quotas...; o mais preparado porque o que mais países visitou e é preciso ter visitado os países para conseguir mais exportações; enfim, os exemplo abundam). Mas também se enganou quando não o patrocinou porque a sua expressiva - mas não "única" (basta pensar em Pintassilgo 1986 ou Alegre 2006) - votação teria sido uma vingança como a que Soares gosta - pública. Isto de ter feito a Alegre o que ele lhe fez há cinco anos, mas só em privado, deixou-o certamente chateado. Se era para humilhar, era mesmo a sério. A sua entrevista ao DN de hoje só confirma esta minha tese.

- Francisco Lopes é um fóssil vivo, como os celacantos. Há muitos no PC, nesta altura. A palavra é sempre “mudança” e sempre contra a “política de direita”, mesmo que o PCTP / MRPP, por um acaso, fosse o governo neste país. A favor de quê? Da ditadura do proletariado. Eu não tenho nada contra o proletariado. Tenho até tudo a favor. Mas não sei porquê a palavra ditadura sempre me fez, digamos, espécie. Assim como os efectivos da espécie de celacanto sem guelras que se passeiam de bandeira vermelha pelas noites eleitorais. Os comunistas têm uma coisa magnífica: podem ter tido menos que o PCTP / MRPP numa qualquer eleição mas é sempre “uma vitória contra as políticas de direita”. Ao contrário do que disse um comentador, acho que se Francisco Lopes veio para as primárias do partido saber se funcionaria como líder, provou que sim. Funcionaria na perfeição. Será ele, espero, o antecessor de quem conseguirá colocar o PC onde deve – junto com o PCTP / MRPP. O Garcia Pereira do futuro chama-se Bernardino Soares.

- José Manuel Coelho foi uma constatação e uma surpresa. Constatamos todos que se Manuel João Vieira conseguisse finalmente o raio das 7 500 assinaturas que precisa – anda lá, homem, basta sentares-te no Chiado algumas tardes (eu assino!) – teria bem mais do que 5%. E tivemos a desagradável surpresa de ver o resultado completamente descabido que teve na Madeira. “Só” o dobro dos votos do PS. Será candidato contra Jardim nas próximas eleições regionais. E, seja porque Jardim tem outro ataque cardíaco porque não aguenta os ataques do homem, seja porque o povo o que quer é festa e um Coelho em vez do Jardim também dá para afagar, ganhará. Isto se o PS não se lembrar de o apoiar. Senão, Jardim mais uns anos. Mas ganhando, cumprirá o ditado: “atrás de mim virá quem bem de mim falará”. Porque o Manuel João Vieira em campanha é hilariante. Mas como governante – como ele bem sabe (por alguma coisa o seu primeiro acto seria demitir-se, costuma dizer) – seria um desastre.

- Defensor Moura: começou bem, acabou pessimamente. Tive pena. Foi um óptimo presidente da Câmara de Viana do Castelo e não merecia que a vaidade se sobrepusesse ao recato do lar. Começou como um outsider que queria marcar a agenda e, com a votação de entronização do bobo Coelho, acabou por ser o bobo da festa.

E agora, José? Agora “há uma pedra no meio do caminho”, como escreveu Drummond. E não, não se chama Aníbal. E não, não se chama Portugal. É uma pedra com oitocentos anos de história, sim, mas um nome colectivo, não comum: é um cardume, é uma matilha – depende dos dias e do estado de espírito. E é uma pedra definida por um peixe ou um lobo ou o que for – definida pelos portugueses. Enquanto não se alterarem mentalidades (por muito lato que este conceito seja, concedo), não há nada a fazer. A pedra que temos no meio do nosso caminho somos nós.



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Sábado, 22.01.11

Este post é dedicado ao Changuito e aos editores da Língua Morta.

Chegado de uma agradável visita à livraria do Changuito (1 - mesmo com alguns décibeis a mais, de minha inteira responsabilidade; 2 - é altura de começar a grafar o nome dele em condições), onde comprei o livro Exercícios para Endurecimento de Lágrimas de Maria Sousa (Língua Morta, 2010), visitei, como o faço de vez em quando, o blogue do Henrique Manuel Bento Fialho. E deparei-me com este post.

Se ao que lá vem escrito se somar a tiragem do livro da Maria Sousa (150 exemplares, também), noto uma estranha queda para a limitação da poesia. No caso do Henrique levada ao extremo do "foram feitos 150 exemplares únicos e irrepetíveis. Em nenhuma circunstância estes poemas voltarão a ser editados enquanto eu for vivo. Não estará [o livro] à venda nas livrarias."

Começo por concordar com o Henrique numa coisa: os poemas não voltarão a ser editados. Quando muito, reeditados. Mas isto é coisa de pormenor sem importância. Não sei se hei-de concordar com esta coisa do dar o poema só àqueles que eu quero mesmo dar.

Uma tiragem limitada tem um de dois objectivos: ou limitar os leitores, escolhendo-os - se possível - dedo a dedo; ou fazer do objecto em si uma raridade logo à nascença, com a ideia de [que]* mais tarde a raridade vire ainda mais rara. Neste último caso, por exemplo, está o livro Pequeno Formato, que o Eugénio de Andrade editou em 1997. Foi oferecido só a amigos, com a ideia muito eugeniana de fazer objectos que fossem valer pelo facto de existirem poucos (eugeniana e, convenhamos, cruzsantiana também). Mas, no mesmo ano, Eugénio colocou os poemas num livro da sua série de obras, o 4, juntamente com Ostinato Rigore, o que o fez disponível a todos os que o queriam ler. Não tinha, por isso, qualquer objectivo o autor de escolher os seus leitores.

O que a Língua Morta (de que admiro o trabalho, quero já dizer que é para não haver aqui mal entendidos) está a fazer (até porque os livros só estão disponíveis na Letra Livre e na Poesia Incompleta, disse-me um dos editores quando eu não fazia a mínima ideia que ia escrever este texto, quero ser bem claro nisto) ou, muito mais, mas mesmo muito mais, o que o Henrique quer fazer é escolher os leitores. Será boa a escolha de leitores? Ou melhor, necessária? Ou melhor, adequada?

Não sei. Este post não tenta responder a nada. Tenta só pensar um bocadinho nas coisas. Eu editei a Teoria dos Conjuntos numa tiragem de 117 exemplares para oferecer a quem quis. Só o coloquei à venda na Poesia Incompleta. Quis escolher os leitores. Mas levar ao limite essa limitação com as frases que o Henrique escreveu, parece-me completamente desadequado. Ele não quer que as pessoas leiam o que escreve? Esses poemas envergonham-no de tal maneira que só os quer dar a ler nesta edição? Sem falar na coisa do "enquanto eu for vivo". Aqui, lamento, mas já entramos um bocadinho na questão eugeniana: parte o Henrique da presunção que alguém o irá quererá reeditar posteriormente.

Uma reflexão, apenas. Talvez mande um email ao Henrique para comprar o livro. Gostava de ler os poemas. Mas corro o sério risco de ver isso ser usado um dia contra mim . Depois de uma agradável troca de emails, há uns anos, enviei-lhe por simpatia o Vou para Casa (uma das coisas boas de editarmos os nossos livros - podemos oferecer muitos). Depois li que eu o tinha enviado de moto próprio, como se quisesse saber a sua opinião. Não foi bem isso, ele sabe. Mas não tem mal nenhum escrevê-lo. A vida é feita destes, digamos, salutares equívocos.

Eu devo editar um livro de poemas este ano. Devido ao que aconteceu às Quasi, onde tinha os meus livros, gostava um dia de poder reeditar alguns dos poemas antigos. E, em ambos os casos, sempre com a ideia de procurar um leitor (reeditando até um ou outro da Teoria já citada). Mas um leitor que me encontre sem que o obrigue a provas de obstáculos, ir a um blogue, mandar um email, ir a uma livraria em particular. Procurar um leitor não é impedir outros leitores. É exactamente editar um livro e colocá-lo o mais disponível possível para que todos possam ler o que escrevemos. Ou será que a ideia de um escritor é ser lido só por aqueles que acha que o merecem? Não creio. Escrever para possiblitar ler. E sem preocupações absurdas com o lugar onde ficarão os versos, lugar esse que, se pensarem bem, não é nenhum. Quantos poetas do século XVII consegue citar o leitor deste post? Como diria o outro, my point, exactly. Ninguém tenha a presunção de querer, como Sá-Carneiro com duas décadas, que a nossa literatura talvez se entenda daqui a alguns séculos. Porque nessa altura, meus caros, não seremos literatura nenhuma. E nem falo de celebridades como Guerra Junqueiro ("o maior poeta da península", no seu tempo, agora pouco ou nada considerado e lido). Falo de gente célebre só em casa (mesmo que com uns décibeis a mais, concedo).

PS: Não espero outra coisa que um ensaio de cinquenta mil caracteres do Henrique sobre este post, claro. E que fique claro que este post utiliza a Língua Morta como um exemplo, não como exemplo a criticar.

 

* Henrique, que desilusão... Por causa da falta de um "que" (erros meus, má fortuna...) nem um considerando acerca do post em si. Eu sei, bastava ter dito o contrário - algo como tenho a certeza que o Henrique não responderá. Mas mais importante: quanto custa o livro e como o pago? Gostava muito que mo enviasse. Posso enviar um email a pedi-lo? Pelos vistos, não. Os meus olhos não merecem os seus poemas. Retirar-me-ei, triste e amargurado, para um monte alentejano onde me tornarei um eremita devido a tamanha privação, acredite.



publicado por JRS às 20:18 | link do post | favorito

Para quem ficou surpreendido com o, digamos, "tom" de Ricky Gervais nos Globos de Ouro, deixo duas entrevistas no Daily Show. Acho que elas explicitam muito bem que quem o convidou sabia quem estava a convidar. Hilariantes, claro. Raras vezes Stephen Hawking é tema para humor, mas nada é proibido, como se nota, desde que feito em condições.

Infelizmente, não consigo colocar o video. Ficam os links:

http://www.thedailyshow.com/watch/tue-december-14-2010/ricky-gervais

http://www.thedailyshow.com/watch/wed-december-13-2006/ricky-gervais

 

 



publicado por JRS às 13:16 | link do post | favorito

Quinta-feira, 20.01.11


publicado por JRS às 19:38 | link do post | favorito

Terça-feira, 18.01.11

Sou um paz de alma. Sempre fui. Medricas que chegue para perceber que se me metesse em confrontos físicos o mais certo era ficar com mazelas físicas. O facto de ter sido um lingrinhas contribuiu muito para ter virado um verdadeiro pacifista no que às questões mais comezinhas diz respeito. Digamos que acredito na paz por pragmatismo e interesse pessoal.

Mas - sem querer com isto acusar indevidamente o infantário em questão, que aqui tomo apenas como exemplo - se fizessem isto ao meu filho, dava bem mais do que duas lambadas à educadora. E não havia medo que me tolhesse a mão.



publicado por JRS às 20:07 | link do post | favorito

Não aconteceu nada. Ninguém me veio insultar anonimamente mais do que o habitual. Ninguém escreveu um elogio que me embaraçasse mais do que habitual. Não. Só achei que era altura. O facto de, há algumas semanas, terem colocado um comentário usando o nome de uma outra pessoa e de ter percebido que não tinha como controlar isso, ajudou. Isso não nego. Mas é altura de acabar com a caixa de comentários. Quem me quiser embaraçar, pode sempre usar o j.reis.sa@gmail.com.



publicado por JRS às 20:01 | link do post | favorito

Segunda-feira, 17.01.11



publicado por JRS às 00:49 | link do post | favorito

A uma antologia devem ser exigidos, pelo menos, um de dois contributos: ter uma perspectiva didáctica e preambular sobre os autores ou temas que a fundamentam; dar aos poemas que a compõem uma leitura renovada. Este último contributo era quase obrigatório para os organizadores de Poesia Com Cinema, uma vez que, de outra forma, não se justificaria a republicação de poemas ainda tão recentemente postos à disposição dos leitores ou de poemas que, apesar de mais remotos no tempo, continuam disponíveis nas estantes de muitas livrarias. Mesmo tendo em conta o risco assumido pelos organizadores na forma de sistematização e apresentação da antologia, o qual deve ser reconhecido – e elogiado –, o produto final raras vezes ultrapassa a mera republicação. Trata-se, assim, de uma opção desafiante mas concretizada sem nenhum risco.

Aqui e aqui.

Fico sempre tão feliz quando vejo alguém dizer que há muitos livros de poesia disponíveis nas livrarias. E que, por isso, não faz sentido fazer uma antologia temática que é completamente diferente de outras, se não mais porque organiza os poemas de uma maneira idiossincrática. (Outras há que o não fazem de todo, mas nunca li um reparo que fosse a alguma dessas. Essas, claro, não são republicação de autores disponíveis nas livrarias.) Exemplo: Movimentos no Escuro, de José Miguel Silva. É todo sobre cinema. Mas como saiu há pouco tempo na Relógio D'Água (2006), e como a tiragem de 1 000 exemplares que foi feita demorará os seus vinte anos habituais a esgotar, nada de colocar um poema do José Miguel Silva numa antologia temática. Bem, é um critério como outro qualquer. A partir de agora, caros amigos, sigam o conselho do David Teles Pereira: antologias temáticas só de poemas que não estão disponíveis nas livrarias. Dos outros, coloque-se por favor a referência bibliográfica e o leitor que os vá comprar. Acho bem. Como editor de poesia, acho até muito bem. É que isto de divulgar a poesia pode trazer leitores para o feudo e depois perde-se aquele encanto infantil do eu sei e tu não. Entendo bem o David. Embora, lamento, não comungue deste seu ideal tão reservado.



publicado por JRS às 00:27 | link do post | favorito

Quarta-feira, 12.01.11

Dizem que chove sempre a norte do cabo

Carvoeiro, a neve só nas terras altas. Moro

ao nível do mar, e no entanto a espuma é

longe demais para molhar os pés no meio

do sargaço. Nunca neva nas terras mais baixas.

E chove sempre no Norte, onde espalho notícias

de um sol ainda mais distante. Tenho quase

quarenta anos e nenhuma luz. Não há quem me

brilhe ou faça brilhar, visto roupas escuras até

no verão. Limito-me a arrefecer os raios na minha

pele sempre fria. Aquecer é coisa que deixo para

 

as mulheres modernas que habitam à vez o meu T1.

Basta-me viver, se soubesse para onde, aí sim, fugia.



publicado por JRS às 21:18 | link do post | favorito

Sei bem das minhas qualidades e dos meus defeitos enquanto editor e escritor. Como são actividades adjacentes, as qualidades de uma profissão costumam ser as qualidades de outra. E o mesmo com os defeitos. E um deles, grande, é ser um péssimo revisor. Mas, como diz o outro, para isto é que existem os revisores.

Um anónimo "destro" (?) [nota: irei em breve ver como funciona verdadeiramente a questão da moderação dos comentários, que pelos vistos a facilidade de se ser anónimo ou, pior, fazer-se passar por outra pessoa, é muito grande] fala num comentário a este post de duas gralhas aí existentes como se isso fosse questão de vida ou de morte. Não é. As gralhas, infelizmente, são o pão nosso de cada dia para quem escreve. Neste caso, escrevendo como escrevo directamente no blogger, às vezes passam. Santinho. Só quem não escreve não as faz. Ou então quem acha que ter trocado de ordem duas consoantes é mais uma boa razão para insultar as pessoas. Desta vez, o termo é a dar para o lerdo. Muito obrigado!



publicado por JRS às 20:09 | link do post | favorito

 

 

If we were children I would bake you a bud pie, warm and brown beneath the sun. Never learned to climb a tree but I would try, just to show you what I've done.  A Fine Frenzy, Alison Sudol



publicado por JRS às 00:10 | link do post | favorito

Quarta-feira, 05.01.11

Este mês, na secção Retrovisor da revista Bltiz [Blitz] há um texto meu. Não é coisa pequena. São mais de 10 000 caracteres sobre Deus Nosso Senhor, Dawkins, Occam's Razor, os Sirgur Rós [Sigur Rós] e, claro, Leonard Cohen. Leitura muito particular dos três tipos de apresentações ao vivo existentes - vão ver qual é a de Cohen.

 

 

Dito isto, poder-se-á até dizer que eu tenho várias questões com Deus e o Messias. Uma delas é exactamente haver a forte possibilidade de Ele não ter questão nenhuma comigo.



publicado por JRS às 07:51 | link do post | favorito

Sexta-feira, 31.12.10

Em cima, Haverá / um acordar, últimos versos de um maravilhoso poema de Cesariny que terminam o ano na antologia "Dou-te um Verso", editada na Babel.

Em baixo, Caetano Veloso canta, num arranjo simplesmente perfeito, uma música de Lulu Santos, poema de Antonio Cicero, mais uma vez. E, mais uma vez, a verdade absoluta de dois versos:

Só falta reunir a Zona Norte à Zona Sul

Iluminar a vida já que a morte cai do azul.

E a beleza maravilhosa dos dois seguintes:

Só falta te querer, te ganhar e te perder

Só falta acordar, ser gente grande pra poder chorar.

Mas todo o poema, todo este O Último Romântico é tão maravilhoso que muito apetece ver e rever e rever.

Com votos de um bom 2011, cheio de coisas boas. Mais do que tudo, como diz a minha avó, com saúdinha!

 

 



publicado por JRS às 19:28 | link do post | favorito

Quinta-feira, 30.12.10

Musicado pela Adriana Calcanhotto, é quase impossível de ler sem trautear, nem que seja um pouco, a melodia. Mas tentem. É um grande poema de um grande poeta chamado Antonio Cicero, que tive a honra de editar em Portugal. Este Inverno, pertença do seu primeiro livro, Guardar, tem três dos versos mais verdadeiros alguma vez escritos em língua portuguesa. Adivinhem quais são.

 

Inverno

 

No dia em que fui mais feliz 
eu vi um avião 
se espelhar no seu olhar até sumir

 

de lá pra cá não sei 
caminho ao longo do canal 
faço longas cartas pra ninguém 
e o inverno no Leblon é quase glacial.

 

Há algo que jamais se esclareceu:

onde foi exatamente que larguei

naquele dia mesmo o leão que sempre cavalguei?

 

Lá mesmo esqueci 
que o destino 
sempre me quis só 
no deserto sem saudades, sem remorsos, só 
sem amarras, barco embriagado ao mar

 

Não sei o que em mim 
só quer me lembrar 
que um dia o céu 
reuniu-se à terra um instante por nós dois 
pouco antes do ocidente se assombrar



publicado por JRS às 01:41 | link do post | favorito

Terça-feira, 28.12.10

As duas Vénus Hotentote demoraram o tempo previsto para reagirem a um pequeno comentário neste blogue. Podem no entanto ficar ambas descansadas: depois de ter ganho a aposta sobre o tempo da reacção, dedicar-me-ei novamente a coisas bem mais produtivas - mas estou de férias, perdoem-me, foi mais forte do que eu.

Uma coloca aqui o seu auto-retrato, certamente em homenagem às suas origens africanas, conseguindo desmontar toda a minha estratégia em três linhas - o que eu mais quero é aumentar o número de transeuntes nesta Rua à sua custa, claro.

A outra deambula por melindres inexistentes e uma campanha publicitária bem interessante acabando a querer que se chamem os bois pelos nomes: embora bípede, pareço ser o único ser vivo dos quatro que tem a coragem de, na blogosfera, ter um nome que permite saber-se de quem se trata. O que, bem vistas as coisas, com ou sem os tracinhos que tanto irritam tanta gente, deve querer dizer alguma coisa. Uma boa pergunta - a que o senhor Macieira já respondeu - é saber se ambas as senhoras teriam a coragem de escrever o que escrevem se o anonimato não fosse a armadura dos fracos.

E, como os americanos, eu resto o meu caso



publicado por JRS às 23:42 | link do post | favorito

Segunda-feira, 27.12.10

Telefonam-me desde Portugal em pânico! "Jorge, o senhor Macieira deixou raízes de onde outras árvores se levantam!" "Jorge, és saco de pancada até mais não, dão-te com força, põe-te a dançar, citam uma frase tua ao lado de uma da Margarida Rebelo Pinto!"

Sobressaltado, interrompo imediatamente as férias. Digo: "regressarei a Lisboa na primeira oportunidade!" E, como quando há um desastre natural qualquer, em que o político de serviço vai visitar a catástrofe para 1) dar apoio moral e, claro, 2) inteirar-se da situação in loco, estou já na viagem de regresso. Quero ver in loco a catástrofe.

Mas afinal, não há catástrofe. Só dois arbustos que estavam certamente plantados à sombra da árvore do senhor Macieira e que, com a sua queda por harakiri, cresceram de encontro ao sol do anonimato. Um cita-me mais vezes do que o Papa Bento XVI invoca Jesus Cristo na Missa do Galo. O outro, começa logo a citar-me mal.

A meio da viagem volto portanto para trás. A força de vontade dos dois anónimos é tal que vamos ter gracinhas para meses, pelos vistos. Quarenta posts em Dezembro, literalmente cruzes, credo! Mas são gracinhas, nada mais. É que - cuidado, preparo-me para elogiar o senhor Macieira - a árvore que lhes permitiu o sol tinha pelo menos graça. Estes, nem isso. São apenas duas Vénus Hotentote a passearem-se pelo século XXI como se estivessem no século XIX. Com a agravante de a isso não serem obrigados.

PS: Uma nota que me parece interessante: como bons mercenários, estas duas Vénus Hotentote atiram em todas as direcções. O primeiro soa-me a um rapaz que conheço, que o tom e a pontaria estão mais afinados. O segundo faz o senhor Macieira começar a provar o próprio veneno. Como se diz nos círculos bem pensantes lisboetas - que giro.



publicado por JRS às 20:16 | link do post | favorito

Domingo, 19.12.10

Partamos do pressuposto que quem cá vem o faz de três em três ou de quatro em quatro dias. Isto dá umas setenta a cem pessoas a pousarem aqui os olhos. Demos de barato que é só gente que não tem a minha fotografia no local para onde atiram os dardos. Porque a ideia é elogiar, e não me apetece elogiar quem faz de mim objecto de vodoo (quer dizer, até apetece, mas isso fica para outro post). Caros e caras, no fundo o que vos quero dizer é o seguinte:

- Obrigado pelas vossas visitas.

- Tenham um Natal cheio daquilo que mais desejem.

- Entrem em 2011 sem grandes revoluções mas com boas resoluções.

- Eu nas próximas duas semanas vou ali e já venho, pelo que a assiduidade de considerações sobre o André Villas-Boas, o António Guerreiro ou os Blur será menor.

Fiquem bem.

Vosso.

Jorge



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Sexta-feira, 17.12.10

Não resisto. Para imediata compreensão sigam por favor directamente para o post respectivo no blogue Revisitar a Educação. Mas, se quiserem, vejam lá se adivinham.

O texto sobre a antologia é a sinopse que acompanhava o comunicado para a imprensa da Porto Editora. Mas notem qual a citação que destacaram de um dos textos que sobre a antologia foi escrito. Reza assim:

«Uma descrição objectiva desta antologia não pode deixar de destacar estes aspectos: a sua singularidade, a sua dimensão superlativa, a sua extensão panorâmica elevada ao máximo possível. Na verdade, trata-se da única antologia da poesia portuguesa que percorre toda a história literária desde o século XIII até ao século XXI [...]. Projecto antológico mais grandioso do que este realizado por Jorge Reis-Sá e Rui Lage é difícil imaginar.»

Dou um doce a quem me souber dizer quem escreveu estas frases e onde. Sem batota.



publicado por JRS às 23:13 | link do post | favorito

Quinta-feira, 16.12.10

 

Conheci-o mal. Entrevistou-me uma única vez, teremos falado pouco mais do que uma dezena de vezes. Mas, no entanto, era como se nos conhecêssemos. Não desde sempre, as palavras usuais para os amigos. Carlos Pinto Coelho não era meu amigo, não aconteceu, verbo que será repetido muitas vezes nos próximos dias. Mas era como se nos conhecêssemos porque ambos vivíamos dentro dos livros - eu editando, escrevendo; ele divulgando, oferecendo. Ambos lendo, claro.

Da única vez que me entrevistou, há um ano, nos estúdios onde gravava o Assim Acontece para que tantas rádios locais o repetissem, surpreendeu-me. Foi sobre os Poemas Portugueses. Não gostei. Porque todas as entrevistas que me costumavam fazer sobre a antologia partiam de perguntas como que acríticas. O que era a antologia, como lá tínhamos chegado, etc e tal. Ele não. Ele a certa altura disse "mas tem muitos poemas maus". Fiquei desarmado. Disse que não, que não tinha. E ele replicou "tem, sabe que tem". Não sabia. Não sei. Mas imagino que um dia, com sessenta e seis anos, olhe para trás e diga que tem. Ele achava que tinha e confrontou-me. É o melhor elogio que lhe posso fazer.

Uma das suas menos conhecidas actividades era como fotógrafo. Que conheço mal. Mas fico sempre maravilhado com a fantástica fotografia que, em boa hora, permitiu que usássemos há vários anos no Berçário do Rui Lage. Fica aqui. [Em cima, fotografia de Pedro Palma.]

 

 



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Quarta-feira, 15.12.10

Caro senhor Macieira

espero, sinceramente, que o seu afastamento (ali sentado, para citar o Daniel Maia-Pinto Rodrigues, autor de sua predilecção) do Máscara & Chicote seja apenas um achaque que o tomou em dia de clausura de Assanges e outros que tais. Saiba que o seu silêncio será para a blogosfera, em geral, e para a bondage literária, em particular, uma perda irreparável. E rogo-lhe que não tenha visto em quaisquer minhas palavras mais do que um anotar de coincidências sem qualquer valor que não seja esse - a bendita serendipidade.

Com um abraço amigo, deixo-lhe a dona Oliveira, num poema que espero não seja a propósito.

Seu

Jorge

 

A Elisabeth Foi-se Embora

(com algumas coisas de Anne Sexton)


Eu que já fui do pequeno-almoço à loucura
eu que já adoeci a estudar morse
e a beber café com leite
não posso passar sem a Elisabeth
porque é que a despediu senhora doutora?
que mal me fazia a Elisabeth?
eu só gosto que seja a Elisabeth
a lavar-me a cabeça
não suporto que a senhora doutora me toque na cabeça
eu só venho cá senhora doutora
para a Elisabeth me lavar a cabeça
só ela sabe as cores os cheiros a viscosidade
de que eu gosto nos shampoos
só ela sabe como eu gosto da água quase fria
a escorrer-me pela cabeça abaixo
eu não posso passar sem a Elisabeth
não me venha dizer que o tempo cura tudo
contava com ela para o resto da vida
a Elisabeth era a princesa das raposas
precisava das mãos dela na minha cabeça
ah não haver facas que lhe cortem o
pescoço senhora doutora eu não volto
ao seu anti-séptico túnel
já fui bela uma vez agora sou eu
não quero ser barulhenta e sozinha
outra vez no túnel o que fez à Elisabeth?
a Elisabeth foi-se embora
é só o que tem para me dizer senhora doutora
com uma frase dessas na cabeça
eu não quero voltar à minha vida



publicado por JRS às 20:48 | link do post | favorito

 

Sento-me na Fnac do Chiado, ali entre o início da sala dos livros e o corredor para os dvds, onde agora colocaram os livros, discos e dvds infanto-juvenis. Sento-me lá para olhar.

É que pelos vistos acabou o exercício físico. Prevejo fechos em série nos campos de ténis, pavilhões, até nas piscinas deste país. Há coisas que nos fazem fazer exercício como se fosse mesmo - e não estou a falar de vibradores de cinta, vendidos às quatro da manhã na TVI. Falo de consolas.

Pelos vistos, agora, joga-se de tudo em Nintendos, Xboxes ou afins. Dois rapazes corriam enquanto um rapaz corria numa pista de tartan virtual. E depois, ó Deus, saltavam em comprimento, sete metros e setenta e cinco, novo record mundial. Prevejo para breve gente a esbracejar junto à alcatifa da Fnac para bater os recordes do Michael Phelps.

Mas alguém me pode explicar que raio de interesse tem fazer de conta que jogamos ténis de mesa com um chinês rendido ao capitalismo mas que não existe? Mas ninguém me precisa de explicar o que isso fará - está a fazer - pelos desportos em si. Os miúdos quando virem o peso de um raqueta, de uma bola daquelas brancas e que parece tão leve, vão perceber que a realidade virtual não pesa nada. E que, como não pesa, nada acrescenta. Só vazio, vácuo, sistemas de baixas e inexistentes pressões. Onde? No cérebro, aquele que mais fica - pela falta de exercicío real - menos exercitado.

Enfim, sou um velho conservador a prever 1984 em 2011. (Quer dizer, mas já sem o comando, claro...)



publicado por JRS às 00:33 | link do post | favorito

Domingo, 12.12.10

Só vi na capa, ainda: a Alexandra Lucas Coelho está no Brasil, em reportagem. Quer isto dizer que dentro de alguns meses temos mais um livro da colecção de viagens da Tinta da China, dirigida pelo Carlos Vaz Marques. E ainda bem.



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Quinta-feira, 09.12.10

Hoje, nove de Dezembro do ano da Graça de Nosso Senhor de 2010, este blogue bateu o seu record de visitas! (Não vamos nessa mariquice das page views: this is hardcore - roubadinho aos Pulp). Ainda faltam duas horas para o fecho das urnas mas, desde que há registos - 25 de Novembro do ano da Graça de Nosso Senhor de 2010 -, o dia de hoje neste blogue já cilindrou o antigo recorde por, nada mais nada menos, do que 3 visitas! Diga, portanto, 33!

A todos os 33 visitantes, gente boa, amiga, companheira, camarada, leitora ou vinda ao engano, o meu mais do que agradecido agradecimento. Voltem sempre! E tragam outro amigo, companheiro, camarado, leitor ou gente ao engano também.



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Terça-feira, 07.12.10

Ter a certeza é logo um verso. É coisa esquisita, isto de ter uma certeza. Entendo que tenhamos cães, gatos, sofás ou contas nas Ilhas Virgens. Mas certezas? Pois bem, eu tenho uma - não uma, a - certeza.

E é esta: o facto de eu ter escrito este post e de a partir daí o senhor Macieira ter mantido a fã do Casimiro de Brito suspensa como o gato do MEC doente naquela crónica é mera coincidência. Tenho a certeza. Mas fico triste. Que fico triste, fico.



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Sexta-feira, 03.12.10

 

Toda a gente fala de Sá Carneiro. Minto: toda a gente menos Pedro Santana Lopes. Cumprindo o prometido, Pedro Santana Lopes só usou dois terços da sua crónica no Sol de há duas semanas para dizer que não ia falar dele. A semana passada não comprei o jornal. Imagino que tenha voltado a dizer que não ia falar dele. Esta semana usa um terço do espaço para falar dele, mas no fundo não está a falar.

Toda a gente e até Vasco Pulido Valente. Pelo que tenho lido sobre Sá-Carneiro, ele não era assim bem de direita naquela altura. Mas Pulido Valente, que não lê os anos de 1974-1980 com as lentes de agora (nem pensar!) acha que ele queria era fazer um partido de direita. Ele trabalhou com ele, deveria saber do que fala. É até esse o seu argumento: "eu trabalhei com ele". Mas, lamento, não colhe. Não basta trabalhar, é preciso lembrar convenientemente e à luz das circunstâncias da época.

Toda a gente e mais gente no Sol. Gente como Basílio Horta que diz que o PSD e o CDS se teriam fundido um com o outro se Sá Carneiro não tivesse morrido (ele só provocou duas grandes dissidências no PPD, de centenas de militantes cada uma,  durante o seu breve reinado - nota-se que era um homem de consensos...), gente como Almeida Santos que diz que o PSD estaria bem mais próximo do PS porque "Sá Carneiro era mais à esquerda do que eu" [sic]. Gente que não leu o Vasco Pulido Valente, com certeza. Mas que leu Pedro Santana Lopes: "Todos os exercícios de imaginação são admíssiveis". Até fazer o fútil exercício de "o que seria isto se isto não tivesse sido isto". Eu aposto que teria sido aquilo, não isto.

 

Termino por estes dias a leitura da reedição da biografia de Maria João Avillez. Acho bem - e até intelectualmente honesto - que não tenha mexido em nada, acrescentando apenas uma nova introdução. Tenho pena, no entanto, que perca em comparação com a de Miguel Pinheiro (embora se note que ele muito a considera) pela ausência das indicações de algumas fontes importantes e, bem mais importante, por uma edição pobre, que coloca fotografias do dia da apresentação do PPD (em 1974) no corpo do texto junto com o ano de 1976. E, ainda mais importante, que perca pela existência de algumas gralhas que são erros de facto e que uma revisão cuidada - e não falo de Maria João Avillez, claro - deveria ter corrigido.

 

[Em cima, fotografia de Alfredo Cunha]



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Quinta-feira, 02.12.10

Movido por uma conversa com o meu professor de Zoofilogenia e Evolução, li A Criação de Edward O. Wilson, editado na Gradiva há pouco tempo. Na capa escreve-se "Um apelo para salvar a vida na Terra". Logo depois "Por favor, leia este livro". Ficaria melhor se, por baixo deste segundo apelo (neste caso, da Gradiva) se tivesse colocado o autor da frase, Michael Ruse, eminente darwinista e filósofo da ciência. Assim, é só uma maneira nova de dizer "Por favor, compre este livro".

Mas o livro. É de um naturalista dos quatro costados. De um homem que dedicou a sua vida às formigas como se as formigas representassem todas as espécies vivas. Que representam. Quero com isto dizer que é um livro de um apaixonado pela Natureza, assim em maiúscula. Por isso, por vezes, tem algumas frases que estão para a ciência como a Florbela Espanca para a poesia: é muito bonito e tal, mas não precisava de tanto ponto de exclamação. Quero com isto dizer que Wilson ama a maravilhosa diversidade que temos na Terra porque ama todos os animais da Terra (estou a ser injusto, ele cede no que respeita a três espécies de piolhos exclusivas da nossa espécie e ao mosquito portador do protozoário que nos causa a malária e lá diz que se devem guardar como o virus da varíola, mas que se poderiam extinguir). Quero com isto dizer que tem alguns excessos, portanto. Mas quero também dizer que há muito que não lia um livro tão desassombrado, apaixonado e - em tanta coisa - verdadeiro.

O meu professor tinha-me falado da sustentabilidade. Que a questão da preservação da biodiversidade se deve colocar na própria sustentabilidade da biosfera e nela da espécie humana. No fundo, eu também acabei por dizer isso aqui, mas dando mais destaque ao argumento humanista. O meu professor ensinou-me - mesmo tendo eu deixado a faculdade há dez anos - que a questão humanista, por ser dicotómica (humanismo / naturalismo) é estúpida. E, claro, está certo.

Entendo Wilson quando acaba por cair no argumento da preservação daquela espécie só porque é única. Ele está apaixonado pela vida natural, e defende-a até ao limite. Eu quando começo a falar da questão do ensaio de 84 de Gould na Natural History, da mudança do nome de Némesis e da extinção dos dinossauros fico na mesma, meio perdido na beleza que vejo onde outros ouvem tédio. Mas Gonçalo M. Tavares diz bem na LER deste mês: viva o tédio. O meu tédio pela preservação daquela espécie particular devido à sua beleza natural é o deslumbramento de tantos. E é isso que equilibra as coisas.

Mas da preservação da biodiversidade: agora que aprendi que a dicotomia é estúpida, aprendi que aquela espécie particular pode, como as asas da borboleta que batem no Jardim Botânico do Porto, fazer com que haja mais vento no deserto de Mojave. A sua preservação permite que a biosfera esteja equilibrada e que por isso permita que também nós estejamos nela equilibrados. Wilson sabe do que fala, acreditem. Por favor, leiam o livro dele.  



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Quarta-feira, 01.12.10

Foi demasiado às claras, José. Que desilusão... E eu a pensar que a coisa já vinha de casa estudada. Agora levas um jogo. Mas... eis que... com multas de tostões ou não, lá se cumpriu o objectivo: tudo limpo para os oitavos. A UEFA parecia tê-los no sítio - mas não teve.

A notícia do Público e o video:

José Mourinho vai cumprir um jogo de castigo na Liga dos Campeões, após ter sido condenado pela comissão disciplinar da UEFA pelos cartões forçados por Sérgio Ramos e Xabi Alonso no Ajax-Real Madrid realizado em Amsterdão para ficarem disciplinarmente limpos para os encontros dos oitavos-de-final da Champions.

Mourinho, que foi ainda multado em 40 mil euros, vai assim ficar na bancada durante o Real Madrid-Auxerre, da última jornada do Grupo G da Champions, mas regressará ao banco "merengue" para os oitavos-de-final. O castigo da UEFA ao português foi de dois jogos, mas um deles fica suspenso durante três anos.
Por seu lado, Ramos e Alonso foram multados em 20 mil euros cada um, mantendo os respectivos jogos de castigo no encontro com o Auxerre - logo, ficam livres para os oitavos-de-final, para os quais o Real está qualificado - enquanto Iker Casillas e Jerzy Dudek, que transmitiram as ordens de Mourinho para os jogadores forçarem a acção disciplinar do árbitro, foram multados, respectivamente em dez mil e cinco mil euros.
O Real Madrid, por seu lado, foi multado em 120 mil euros e, segundo os regulamentos da UEFA, tem três dias para recorrer da decisão

 

 



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Segunda-feira, 29.11.10

(Ao intervalo)

 

É daqueles jogos que são jogões e que por isso estão cheios de coisas que nós sabemos serem sempre cinzentas. Mas olha eu a preto e branco:

- O Real entrou pior, e sem perceber encaixou dois em pouco mais de 15 minutos. E ainda uma bola à barra.

- Os erros inidividuais pagam-se caro: é incrível como o Marcelo deixou o Pedro passar por ele no segundo golo.

- O Ronaldo teve uma reacção normal de quem se sente gozado - como foi - pelo Guardiola. Eu vinha para a rua, mas pregava-lhe um soco.

- O Valdes correu meio campo para empurrar o Ronaldo e levou amarelo como o Ronaldo. Até aceito. Só acho mal o Guardiola ter continuado no banco.

- O Valdes fez penalty sobre o Ronaldo e nem houve penalty marcado nem houve segundo amarelo.

- O Ricardo Carvalho mexeu o braço esquerdo porque o Messi o estava a agarrar com a mão direita - se levou uma cotovelada do Carvalho foi porque foi atrás dela. E com ela um amarelo.

- O árbitro é um gajo com os ts no sítio. Num jogo destes não andar sempre a apitar (quando o podia fazer), tendo um critério bem lato de análise dos lances mais divididos, é de alguém que pensa que consegue controlar um Barcelona-Real. Não consegue: aposto que se continuar assim não acabam 11 contra 11.

- O facto do Ozil ter passado ao lado do jogo foi, em meu entender, o factor mais importante para o resultado (olha, acabou de ser substituído ao intervalo: não percebo puto de futebol, mas pelos vistos vi isso desde Lisboa.)

Dito isto: puta que pariu, que grande jogo de futebol.

Vamos ver como reentra o Real. 

 

(Algumas horas depois do fim do jogo)

 

O Real reentrou pessimamente. Quinze minutos passados e já estavam quatro encaixados nas redes do Casillas. Depois foi ver o carrocel a funcionar. Apontamentos:

- Péssimo jogo de Benzema, Di Maria e Marcelo. Num Real a afundar, estes foram quem puxou para baixo. Porque defenderam mal e atacaram pior.

- Os defesas centrais portugueses fizeram o que podiam e o que não podiam. E tiveram sorte, que o Ricardo Carvalho deveria ter sido expulso por ter cortado a bola com a mão (levou amarelo - o jogador do Barça isolava-se).

- O árbitro aguentou-se bem. Parabéns. Só foi pena ter tido uma influência decisiva no resultado ao não expulsar o Valdes e marcar o penalty (o já citado).

- Os jogadores do Real aguentaram até ao minuto 92. Só aí Sergio Ramos colou o pistão. Quis partir a perna ao Messi, que teve a sorte da protecção de uma outra perna, de um colega de equipa. Não contente, Sergio Ramos ainda agrediu Pujol e Xavi. Deve levar pelo menos uns 4 jogos.

- Mourinho não se levantou toda a segunda parte. No final, na conferência de imprensa, disse que esta derrota era fácil de digerir. Porque tinha sido tão justa que não custava tanto como uma injusta. Quando se lembrou desta para incutir força para o balneário, tinha certamente acabado de levar o quarto golo. Ficar sentado já deve ter sido parte do plano, imagino.

Dito isto: fiquei fodido, queria que o Real ganhasse. Gosto do Mourinho. Mas ver o Barcelona jogar é como ouvir uma sinfonia do Bethoven. Eram oito os titulares que tinham saído da cantera blaugrana. E quando Jeffren, outro miúdo da cantera, fez o quinto golo, o que se festejou foi toda uma filosofia, não foi um golo.



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Domingo, 28.11.10

 

Tenho muita simpatia pelo André Villas-Boas. E alguma inveja.

Simpatia, porque é do meu ano da graça de Nosso Senhor de 77, é assertivo, sabe o que quer, é bom naquilo que faz. Inveja porque tem o hífen no nome. Como já disse noutro post, tem a sorte de ter um apelido tradicional. Ainda para mais com dois lls no Villas, não se pode comparar com um coitado de um Reis-Sá, impedido por lei de ser registado. 

Mas estou apreensivo com o seu percurso no Futebol Clube do Porto. Isto porque tem ganho os jogos quase todos mas empatou dois. Poderia ser visto como uma coisa boa, claro. Mas ele já foi expulso por duas vezes. E, pasmemo-nos, nos dois jogos em que empatou. Começa a ser uma tendência. Temo que no próximo empate volte a chamar caro colega a outro árbitro e esteja mais dois jogos na bancada. Mas temo bem mais o que poderá acontecer quando perder um jogo. Perderá, aí sim, totalmente a cabeça? Veremos o homem a correr atrás de um dos apanha bolas? Ou a invadir a claque do adversário munido apenas com a braçadeira que usa como uma bracelete? Estou expectante pelos próximos capítulos. E acho muito mal, muito mal mesmo, que o treinador do Porto seja seis meses mais novo do que eu. É sinal de que estou a ficar velho e isso não me agrada nada.



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Quarta-feira, 24.11.10

Estava num hospital às oito da noite. Que funcionava, mesmo com enfermeiros e auxiliares com dísticos a dizer "trabalho mas estou em greve". E que funcionava - funcionou - bem. Mas eis que, no meio da sala de espera, o telejornal se inicia com um José Rodrigues dos Santos contundente: "Em Famalicão, gerente do Intermarché é detido depois de atropelar duas funcionárias do piquete de greve". O meu coração tremeu - aconteceu uma coisa em Famalicão digna de registo na abertura do telejornal e não estava relacionada com a descida do clube para a terceira divisão? Mas onde, em Famalicão? Ao lado da igreja onde fui baptizado e baptizei o meu filho, ali, em Calendário. Liguei imediatamente à minha avó, que mora a cinquenta metros e que me disse, como se fizesse greve mesmo reformada: "não paga aos funcionários e ainda os atropela". Morte ao artista - é deixá-lo penar na cadeia! Mas, pensemos: o que são piquetes de greve?

Diz a "Lei da Greve" que um piquete de greve "pode ser organizado pela associação sindical ou pela comissão e greve para persuadir por meios pacíficos os trabalhadores a aderirem à greve". Diz o dicionário que é um "grupo de grevistas geralmente colocados à entrada do local de trabalho que asseguram a execução das instruções de greve."

Antes de ser apelidado de reaccionário e fascista - como vou ser - pode alguém explicar-me qual o sentido que faz num país livre como aquele onde vivemos, onde existe o direito à greve e - atenção - o direito a não fazer greve, onde existem tribunais, liberdade de expressão, de culto, etc e tal, o sentido que faz, dizia, existir gente que tem o direito de persuadir os trabalhadores a aderirem à greve? Ou, como vem no dicionário e mais acertadamente, gente que deve asseguar as instruções da greve? Reparem, retirei propositadamente o "pacificamente" da primeira frase. Porque não consigo ver nada de pacífico - mesmo que, em vez de atropelamentos por parte da entidade patronal, tenhamos uma coisa que se chama coaçção psicológica quando não física do piquete ao resto dos trabalhadores - em ter um grupo de marmanjos a "persuadir" os, claro, pouco esclarecidos.

É importante dizer que o que o senhor do Intermaché fez é errado, a todos os níveis. Até porque o homem é o patrão e esse não tem o direito de, sem persuasão, ajudar os trabalhadores que quiserem (entregues ao grande capital ou simplesmente lambe botas) a ir trabalhar. Agora talvez não fosse uma péssima ideia um fura greves mandar senão um carro pelo menos algumas frutas para cima do, consagrado na lei, piquete da greve... Mas isto sou só eu a divagar, fascista e reaccionário.

Hoje muita gente fez greve. Concordando ou não, estão no seu direito. Respeito, aplaudo a manifestação de cidadania que representa. Mas eu hoje não fiz greve. Não achei que devia. E pelos vistos, os deputados, que não podem, também não fizeram. Tirando alguns do PC e do BE que foram fazer "trabalho político" para junto de um ou outro piquete. Talvez fosse de ver na justificação para a falta de presença no parlamento se é "trabalho político". Nada como trabalhar para que outros não possam - se o quiserem.

 

 

[Em cima, a igreja de São Julião, em Calendário, que cito no texto. O Intermarché é ali na entrada que se vê à direita na fotografia. Quem desce a rua encontra à esquerda o Campo dos Bargos, onde joga o meu clube. No lado esquerdo (fora da imagem, claro) o cemitério. E a cinquenta metros, a casa dos meus avós. É por aqui que a Justina Ferreira Belo deambula "Todos os Dias"]



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Segunda-feira, 22.11.10

Razões extraordinárias fizeram com que tropeçasse na biografia, escrita por Miguel Pinheiro, de uma personalidade que nunca me despertou a mínima curiosidade - Francisco Sá Carneiro.

A culpa desta falta de interesse da minha parte estava no unanimismo que trazia o seu nome. Achava que tinha sido quase um santo, um lutador contra um regime através da Ala Liberal e uma figura sempre unânime no PSD. E, tenho a certeza, esta é a ideia que a maior parte dos portugueses que não viveram o 25 de Abril e os anos seguintes já adultos têm dele. A ideia mais errada de todas.

Primeiro é preciso dizer que a culpa disto é do próprio PSD, que o entronizou para disso retirar (quando interessava) dividendos políticos. Bastava falar no seu nome num congresso - e Santana Lopes lá arranjava maneira de o fazer sempre - para todos entrarem em transe como se tivessem visto a Virgem Maria outra vez sobre a árvore, pastorinhos que pareciam. À falta, a maior parte das vezes, de uma coluna vertebral política que unisse o PSD, ninguém melhor que uma figura morta, apresentada como unânime e lembrada como assassinada, para o unir.

Mas a leitura da biografia do Miguel Pinheiro altera tudo. Quer dizer, todos sabiam como tinha sido Sá Carneiro. Mas todos tinham feito por esquecer, como quando lembramos depois da morte dos que amamos apenas as coisas que boas que aconteceram (ou as más das que odiamos). Francisco Sá Carneiro era uma pessoa instável, repentista, brilhante mas ao mesmo tempo completamente avessa a compromissos. Como pode um individualista ferrenho virar cala congressos de um partido de governo? Com a ajuda de uma morte trágica e a transferência da alma directamente para um outro político - Pedro Santana Lopes - que assim resolveu a sua instabilidade inventando a estabilidade daquele que lhe deu a alma.

Não nego, pela leitura da biografia, que Santana Lopes tenha sido um dilecto discípulo deste mestre (foi tanto que o seu percurso errático é a melhor homenagem que pode fazer à personalidade de Sá Carneiro - em alguns pontos tão parecida). Mas há um episódio que demonstra bem a mentira que o PSD nos tem oferecido: o nome.

É de todos sabido que Santana Lopes fala no PSD como o PPD/PSD. Quando o faz, imaginamos imediatamente que a transfusão é directa de Sá Carneiro. Nada mais errado. Como nos diz Miguel Pinheiro, Sá Carneiro só criou o PPD em vez do PSD porque nos cinquenta e tal partidos políticos registados nas semanas seguintes ao 25 de Abril, já alguém tinha criado o Partido Cristão Social-Democrata. Foi o escritor Ruben A. que lá ofereceu o mal menor: Partido Popular Democrático.

Passa para PPD/PSD por uma razão ainda mais interessante: o grupo dos dissidentes de Aveiro tinha formado um MSD (Movimento Social Democrata) que se poderia transformar em PSD. Se a isto somarmos o facto de Sá Carneiro ter de andar sempre a explicar pela Europa fora que o PPD era social-democrata e não popular (como são os partidos de direita europeus), achou por bem, em 1976, num Conselho Nacional alterar de PPD para, numa primeira fase e por causa das eleições que seriam próximas, PPD/PSD. O episódio desta passagem é hilariante e deve ser lido nas páginas 476 e 477. Vai desde a mesa do Conselho Nacional começar por não ouvir um protesto até à, suposta, invenção de alguns conselheiros que são contados como abstenções para que estivesse quórum na sala.

Isto é: Sá Carneiro nunca quis ser líder do PPD nem sequer do PPD/PSD. Sempre quis ser líder do PSD. E nós, vencidos não do catolicismo, como diz Ruy Belo, mas da revolução, andamos estes anos todos a pensar que o homem viu alterada a designação do partido depois da sua morte.

É um exemplo, apenas. De tantos os que nos espantam pela surpresa de vermos alterada toda a percepção pública de um homem. 

Quanto à biografia: eu sei, anda toda a gente (ou pelo menos li algures) a professorar que isto de dizer que se lê como um romance um livro de não ficção é um disparate. Não concordo. Até porque este lê-se melhor do que um romance. (O início e a primeira parte do epílogo são de antologia.)



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Sábado, 20.11.10

Como vivo em Lisboa, tive acesso não só à tolerância de ponto de sexta-feira como também a alguns relatórios muito pormenorizados de alguns dos serviços secretos mais secretos do mundo: CIA, KGB, Gestapo, PPBO - Pela Protecção do Bairro dos Olivais (o mais perigoso de todos). E este último soprou-me ao ouvido um segredo muito secreto: a identidade do Mascarilha.

Pode ele estar descansado, que assinei um documento de confidencialidade com 34 páginas e 5 anexos. Mas de que vale um papel que não tenha um formato rectangular e dê para trocar por livros de poemas ou bolas de berlim do Manuelezinho Natário? Mas como estou a ler a biografia do Miguel Pinheiro sobre o Sá Carneiro, tenho ainda mais presente que, nunca tendo nutrido grande simpatia pelo anonimato, sempre tive menos ainda pelo chamado chibanço. Permitir-me-á, no entanto que, a partir de agora, modifique o meu modo de tratamento de sua digníssima pessoa: passará de Mascarilha a Senhor Macieira.



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Sexta-feira, 19.11.10

O Rui Lage já me disse: na sequela do filme Alien vs Predator há a cena mais escabrosa e maravilhosa de ambas as sagas. Eu tentei uma vez ver o filme, mas não passei da primeira meia hora. Um dia estive quase para lá voltar, mas Deus ou o Destino não deixaram e eu não sabia do dvd. Hei-de lá voltar um dia.

Escusado será dizer que entre uma e outra série (as duas juntas, então, em dois filmes nitidamente menores), há um oceano a separá-las. Predator tem um primeiro capítulo relativamente interessante, com um Schwarzenegger um bocadinho melhor que o usual medíocre (só suplantado pela sua prestação nos dois primeiros Terminator onde aproveitaram bem o facto de ele ser um robot a representar para o fazer representar um robot). Alien é outra fruta. Ridley Scott, primeiro, James Cameron depois e David Fincher a seguir fizeram três notáveis filmes, todos eles acrescentando muito à mitologia que HR Giger desenhou. O quarto filme, de Jean-Pierre Jeunet é bom, concedo. Mas não está ao nível dos outros três porque, como seria de esperar, o argumento descamba com a coisa do híbrido no final. Aquilo que era um animal lindíssimo (venha alguém dizer que o alien não é uma coisa esteticamente muito considerável), dá lugar a uma coisa sem qualquer sentido.

Mas isto tudo para dizer que, fâ como sou de ficção científica, fico sempre contente quando há coisas novas a acrescentarem. E este clip, roubado à má fila ao Rogério Casanova, acrescenta muito.

 

 



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Quinta-feira, 18.11.10

Esta é a música mais conhecida de Elliot Smith. Suicidou-se há anos e deixou orfão uma série de seguidores. Não foi nenhum génio, não foi um gajo qualquer: foi só uma pessoa que pegou na guitarra e compôs poesia. Fica o video da música que mereceu reconhecimento global por causa do filme do Gus Van Sant. E, em acrescento, ele como um cisne, nos Óscares, a fazer o que fazia melhor: estar e colocar-nos fora do nosso elemento, como se tudo fosse inesperadamente simples e estranho.

 

 

 



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Sexta-feira, 12.11.10

Talvez devido ao destaque dos booktailors, eis que finalmente alguém não se conseguiu conter e lá arrasou (sapientemente, como se nota) esta crónica.

Só tenho pena da existência de um erro imperdoável: é mentira que Marcelo Rebelo de Sousa esteja registado no Instituto de Socorros a Náufragos. Fui ao site, pesquisei no google, telefonei a amigos, mandei um email ao Chefe de Estado-Maior da Armada - não está. O resto é tudo verdade. Principalmente, como se nota pelo teor da crónica, a última frase.



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Quarta-feira, 10.11.10

Entre os Blur e os Oasis - como é sequer possível que esta pergunta se tenha colocado em 1995! - a resposta é muito evidente: uns são aqueles irmãos tristes e bêbados cuja única coisa boa que fizeram foi ter visto um deles namorar com aquela moçoila jeitosa das All Saints; os outros são artistas e têm como vocalista esse senhor chamado Damon Albarn. Por estes dias tenho ouvido muito uma música. Há quem a queira cantar vezes sem conta e eu acompanho, claro - afinal, por razões diferentes, somos ambos um bocadinho desafinados. Fica o teledisco.

 

 



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Segunda-feira, 08.11.10

Michel Houellebecq venceu o Prémio Goucourt com Le Carte et le territoire. Merecido? Não sei, não li o livro em questão nem conheço os demais concorrentes. Merecido? Se for à luz do que já lhe li, mais do que merecido. Em baixo, a capa que a Fábrica Mutante fez para o Extensão do Domínio da Luta, o seu primeiro romance, e que a Paula Lourenço traduziu para as Quasi há alguns anos. Obrigatório.

 

 



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Sexta-feira, 05.11.10

Confesso que ri com uma parte da prestação de um tal Pimpolho nos Ídolos. Rap-pimba e uma versão do Pão com Manteiga do Tino de Rans, faz rir. O programa presta-se a que uma ou outra destas personalidades apareçam e tem piada pela falta de decoro que algumas possuem. Mas Os Ídolos não é aquilo, é gente a cantar em galas com a Roberta Medina o que só acrescenta à televisão portuguesa. Esse intróito que são os castings é como ver o Terceiro Calhau a Contar do Sol só que com calhaus que em princípio têm terminações nervosas e um centro cerebral um bocadinho maior que o dos répteis. Depois desaparecem, dissolvem-se na população, são só os maiores lá da terra porque apareceram por momentos na televisão a fazer figuras tão tristes que dão muita alegria aos outros. São os nossos bobos pós-modernos, cantores desafinados que não se conseguem autoavaliar.

Mas o que me preocupa é que uma pessoa sem qualquer tipo de noção do que é a realidade que o envolve, em vez de, depois dessa prestação nos Ídolos, ser levada a um psiquiatra que lhe tratasse o desequilíbrio que tem no cérebro, seja aproveitada em programas de televisão que não se deveriam prestar a isso. Falo de um video que no mesmo youtube o mostra numa Companhia das Manhãs a ver lida a contra-capa do seu livro onde se encontra, cito, "aos quinze anos emagreceu devido à prática de masturbação excessiva". Também diz que perdeu a virgindade aos nove com uma prima, mas descansem que ele informa em directo que não houve penetração (a apresentadora responde "não queremos saber", o que me faz pensar exactamente para que o quis então lá).

Mas isto, meus caros, sou só eu a ser um intelectual fascizóide. Temos A Casa dos Segredos e hoje, enquanto esperava uma consulta médica, vi a Júlia Pinheiro (a escritora) a entrevistar três senhoras de idade que tinham em comum o facto de terem tido uma vida tão ocupada que não tiveram tempo nem vontade de foder ninguém. A uma delas fez as perguntas que se impunham: "Nunca beijou ninguém, pois não? É pouco higiénico, não é?" E todos riram com os dentes brancos à mostra, desta vez não da senhora - que já é a maior de Samora Correia porque faz muito voluntariado e ajuda, cito, os "coitadinhos", e não tem culpa de ter passado a vida inteira com um défice hormonal não diagnosticado - mas do maravilhoso país que temos e que leva aos programas das tardes e das manhãs tamanhas personalidades.

O que nos vale é que em horário nobre não há nenhuma casa com segredos onde o filho do ex-seleccionador nacional de futebol acaba processado pelo resto da família. E coisa mais estúpida não há: vai pedir-lhe dinheiro de indemnização e depois quando morrer deixa-o para quem? Ele tem sempre direito a uma parte do que pagou... Deixem lá os pimpolhos deste país serem só o tolo da sua aldeia. Em vez de fazerem de Portugal esta aldeia. Ou então, senhora virgem tão voluntariosa, faça lá o favor de o acompanhar à consulta externa do Júlio de Matos.



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No tempo em que Mark Kozelek ainda cantava e não esganiçava.

A versão original é dos Red House Painters, álbum Songs For a Blue Guitar de 1996, primeira faixa, despida de baterias e parafernálias eléctricas. Esta saiu na banda sonora do filme Vanilla Sky do Cameron Crowe, de 2001. Mas não é a única. Numa edição em vinil da mesma banda sonora, exactamente da editora de vinis de Crowe, há ainda uma outra versão que desta tem apenas uma substancial diferença: mais uns quantos minutos. Notarão, ao segundo vinte e pouco do quinto minuto, a entrada do piano. Que continua. Tenho de arranjar maneira de a passar para o iPod... Com a tecnologia, o gira-discos foi encaminhado para a garagem; mas mesmo que estivesse operacional não permitia a passagem do analógico para o digital. Enfim, sou um gira-discó-para-iPod-excluído. Fiquem com o video, com a menina de O Fabuloso Destino de Amélie num tipo de teledisco feito não sei muito bem por quem e porquê.

 



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Terça-feira, 02.11.10

Caro Amadeu, deixe-me agradecer-lhe primeiro a visita a esta Rua da Castela, situada, como saberá, entre o lugar de Fontelo e a Rua Padre Zeferino José Sampaio, freguesia de Calendário, concelho de Vila Nova de Famalicão. Só por azar não é aquela onde moram os meus avós, que ainda estão no lugar da Castela, mas viram - talvez devido à tão grande proximidade da sua casa com o cemitério e a igreja - a toponímia do concelho oferecer-lhes nome de Padre para a sua rua. Ficou a da Castela para a da parte de trás, mais longe daqueles que diz serem o meu avô os vizinhos mais sossegados que tem.

Mas temo, Amadeu, pela minha saúde literária com o seu verbete. Porque embora diga ter um grande dossier sobre a minha "actividade literária", começar por escrever mal o nome e acabar por errar na profissão (continuo com a responsabilidade de editar livros, agora na Babel, dirigindo as chancelas Pi e Verbo) não augura nada de muito bom para o seu projecto. Felizmente, a segunda parte estará salvaguardada: se não mereci uma referência que seja ao meu umbigo literário no seu pequeno balanço da década, imagino o verbete, com pequeno ou grande dossier, começando e acabando como cita, "Sá, Jorge Reis, Vila Nova de Famalicão - 1977". Mas torna-se um bocadinho grave - mas enfim, que sei eu... - a gralha, ainda para mais voluntária, na forma de grafar o meu nome. É que o hífen quer dizer que o segundo nome que uso como escritor é mesmo Reis-Sá. E que não é muito, digamos, academicamente correcto andar a alterar o nome das pessoas só porque sim. Mas imagino-o a saber bem mais do que o professor catedrático da Sorbonne que fez o verbete do David Mourão-Ferreira no Dicionário de Literatura Portuguesa que a Presença em boa hora editou há alguns anos. E se o argumento for que ele tinha no nome civil o hífen, digo-lhe duas coisas: só não o tenho porque o código civil é fascista e só permite a alteração se for num nome tradicional (o que quer que isto queira dizer); se fizer um dicionário de autores de São Martinho de Anta talvez seja boa ideia colocar no "R" um escritor presencista chamado Adolfo - Adolfo Rocha.

Quanto ao tempo que é outro tempo nas terras pequenas: o meu post era equívoco, perdoe-me. Por muito que haja tanta e boa gente muito feliz em Famalicão com o meu exílio voluntário em Lisboa, este provinciano ainda acha que a cidade grande não rima com onde o coração se esconde mas antes com onde se esconde o coração.

PS: As Quasi sempre se chamaram Quasi Edições - As Quasi Edições. O verbete entrará portanto no "Q", de Quasi. As Edições Quasi nunca existiram. Mas se tivessem existido, aí sim, seriam no "E", de Edições. Ambas antes do "R", de Reis-Sá.



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Segunda-feira, 01.11.10

Deixei Famalicão há um ano. Como diz o outro, com um travo de amargura. Mas fico contente quando alguém - neste caso o Amadeu Gonçalves - dá o devido valor ao que deixei em Famalicão. Isto quando resolve fazer "uma análise sobre a criatividade literária em V. N. de Famalicão, não só no seu contexto local, como também num contexto de âmbito nacional e, como não pode deixar de ser, num plano internacional. Nestes últimos doze anos, Famalicão não tem fugido à regra nestas três perspectivas, na medida em que essa mesma critividade literária se tem manifestado de uma forma original." As Quasi, eu enquanto escritor, que bom quando nos dão valor... Espera lá. Acho que li mal. O quê? Sim, houve uma revista que dirigi com o Walter [sic] Hugo Mãe, a Apeadeiro, e houve... Espera. Não houve mais nada que tenha feito!

Afinal, pelos vistos, não houve mesmo. A Medalha de Mérito Cultural atribuída pela Câmara e que as Quasi receberam em 2004, foi um equívoco. A Loja das Quasi - Espaço de Arte, Literatura e Design ter sido considerada a melhor loja do país de 2008 pela insuspeita Confederação Portuguesa de Comércio e Serviços e pela Escola de Comércio de Lisboa, outro. A colecção Oito Séculos, que as Quasi em co-edição com a autarquia, lançaram e onde se editaram várias monografias sobre Famalicão, outro. A única História de Vila Nova de Famalicão, com 600 páginas e da mesma colecção, outro. As Quasi terem publicado, a partir de Famalicão e durante dez anos, seiscentos títulos, a maior parte deles de literatura e poesia, de prémios Nobel, Camões, Pessoa, etc, outro. E o facto de eu ter escrito alguns livros, editados na Dom Quixote ou na Sextante entre outras editoras (Quasi incluída), ser colaborador da LER e de outras revistas, ter co-organizado a maior antologia de poesia portuguesa, Poemas Portugueses, ter dois romances publicados numa das maiores editoras brasileiras - a Record - ter sido capa do suplemento literário do Jornal do Brasil ou ter tido críticas positivas ao que escrevo na Visão, no JL, no Público, no Expresso, no DN etc e tal, não me faz merecer uma citação como, sequer, autor famalicence.

É porque pelos vistos, longe da vista, longe de uma "análise sobre a criatividade literária em V. N. de Famalicão" feita de forma competente. Paciência. A partir de agora talvez seja altura de começar a colocar "Jorge Reis-Sá nasceu em 1977" sem dizer bem o lugar. Pelos vistos, não vale muito a pena ter nascido e vivido lá até aos 33 anos. Não tem mal: aqui em Lisboa o tempo é outro, mais sol, menos chuva, menos frio. E o Ruy Belo, esse, como sempre, tem toda a razão: "o tempo é outro tempo nas terras pequenas".

PS: escusado será dizer que uma análise à possível existência de uma literatura famalicense só porque há gente que tenha nascido lá - sem sequer se analisar se o que escrevem tem alguma coisa a ver com a povoação - é tão provinciano como o post que escrevi. Mas já me fazia falta ser publicamente provinciano outra vez.



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Domingo, 31.10.10


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Sábado, 30.10.10

Acabei de descobrir como não ser, digamos, importunado. Basta que nos façamos de presunçosos (E fico muito feliz que ele ache isso e me tenha citado, como vou ficar feliz pela quantidade de comentários e de textos em blogues que esta crónica vai provocar – é sinal que estou a fazer bem o meu trabalho.) e o pessoal que poderia, digamos, importunar pensa para ele mesmo: "só para te chatear, não digo nada". Tenho pena. Bem mais do que a crónica anterior sobre o surrealismo, esta queria mesmo lançar o debate. Mas, enfim, as pessoas lá saberão da importância relativa dos assuntos.

 



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Sexta-feira, 29.10.10

Ao segundo sete do terceiro minuto, novamente ao segundo cinquenta e quatro do quinto minuto, há a frase perfeita. Sempre que a ouço é como se por dentro da pele algo se apaziguasse como deve. Uma serenidade, um pedaço de Deus que se nos apresenta como se existisse. É do álbum After Virtue, de 1988, a primeira faixa, Justice. Na sétima música, se não estou em erro, ela volta e close cover.

 



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Terça-feira, 26.10.10

Acabei de ver na RTP2 o que julgo ser a quarta ou quinta temporada do Weeds. E, ainda para mais depois do post anterior, tenho a certeza de que, no meio do tanto que se faz na televisão, o primeiro elemento que constrói ou destrói um episódio e ou uma série é o argumento. Sem estar bem escrito, meus caros, podemos ter todos a melhor ideia do mundo, mas não sairemos nunca da cepa torta (é assim que se escreve?).

Antes de ontem tinha visto na Fox o primeiro episódio da primeira temporada de uma coisa chamada The Forgotten com o Christian Slater. No fim vi que era produzido pelo mago Bruckeneimer e tudo (é assim que se escreve?). Mas percebi dois erros no argumento, além de vero fim a meio do episódio. E eu não percebo nada de televisão e de argumento sei quase só o bê à bá (é assim que se escreve?).

Exemplos de grandes argumentos? Six Feet Under; The Unit; Californication; Weeds. Os dois últimos não sei quem escreveu e, mais importante, sempre, criou e supervisiona. Mas os dois primeiros: Alan Ball e David Mamet. E estamos conversados.



publicado por JRS às 23:42 | link do post | favorito

 

Confesso que comecei a ver a série, seguindo até com algum interesse a primeira temporada. Embora a tenha sentido sempre com um erro de casting brutal, confirmado posteriormente numa pesquisa rápida na world wide web: a Grey que a nomeia é velha demais para a personagem que interpreta. Adiante.

Mas aquilo tornou-se uma coisa sem rei nem roque. Já se fez um spin-off, a Clínica Privada, que só é melhor porque levou esta lindíssima mulher que achei por bem colocar em cima para embelezar um bocadinho este blogue. (Mas, claro, outro erro de casting com aquele pediatra - acho - que tentam despentear para ficar muito casual e muito giro: é feio que dói.) Mas dizia da Anatomia: o que mais irrita num episódio qualquer é que se nota que a Criadora e os seus súbditos argumentistas, depois de já terem ido para cama uns com os outros, têm de inventar personagens que permitam novas combinações. E combinam e não é pouco: é uma telenovela mexicana no seu melhor.

Melhor, no seu pior: a telenovela mexicana baseia-se em diálogos, como todas as telenovelas, e não está para músicas delicododes estendidas até ao limite. O que mais me irrita na Anatomia de Grey é aquela coisa de em cada episódio se salvar o Mundo da Fome, se pensar nos mortos no Sudão, no furacão Katrina ou no Haiti. É certo que não parece, porque é tudo muito interior, digamos. Mas é disso que se trata: de querer em cada episódio merdoso falar sempre dos grandes assuntos.

E como? Pois bem: nada como uma voz omnisciente que vai rodando - como os casais - de episódio em episódio, a debitar novas máximas sobre a Vida, a Medicina, a Humanidade ou a Pilinha do McDreamy. Sempre em maiúsculas, claro. E, sempre - mas sempre, mesmo - ao som de uma música inicial (duas, três...) e de uma música final (duas, três...).

A Anatomia de Grey é o oposto do ER, e por isso tão mau. No segundo tudo era acção. Na Anatomia, cada episódio tem três tempos - dividem-se os 40 minutos em 15 de entrada, 15 de saída e, vá lá, 10 de acção. Quando damos por ela, já vão 15 minutos de episódio e eles ainda não introduziram merda nenhuma - tirando três músicas do Damien Rice. Depois lá vemos uma cirurgia qualquer com muitos pis, pis, pis e um ufa, está quase safo. Mas eis que ainda faltam 15 minutos para acabar o programa e volta o Damien Rice (às vezes os Coldplay) a cantar mais uma xaropada e nós, finalmente, morremos de tédio depois de percebermos qual a Lição Para a Vida que a Criadora da Anatomia nos quer ensinar.



publicado por JRS às 00:18 | link do post | favorito

Quinta-feira, 21.10.10

E como é que se chama o pai?

Pai Reis Sá.



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Quarta-feira, 20.10.10

Aqui deixo, excepcionalmente, o início da crónica deste mês do Pnetliteratura. Raios partam, agora é que nunca mais tenho uma crítica positiva no Actual...

Não tenho por costume guardar jornais. O que sai impresso hoje está amanhã a embrulhar peixe. Tenho pena, no entanto, de não ter guardado um jornal. Foi há um ano, talvez. Era o suplemento do Expresso dedicado à divulgação das artes de nome Actual. O agora Atual teve na altura, nas suas páginas de divulgação literária, uma coincidência – será? – interessante. De um lado, e com uma foto em grande plano, envergando casaco e gravata e pesando quase cem mil exemplares, o novíssimo romance de José Rodrigues dos Santos, se bem me lembro “Fúria Divina”. Do outro, com um tailleur professoral e nome estrangeiro na capa, pesando trezentos exemplares (a que se devem juntar os 14 de depósito legal, os dois que a gráfica guarda e um ou outro que ficou por lá perdido), “A Porta de Duchamp” de Rosa Maria Martelo. Para treinadores, Rogério Casanova e António Guerreiro. O resultado: uma bola preta no lugar de um olho para Rodrigues dos Santos, via Casanova, e cinco estrelas do Olimpo para Martelo, via Guerreiro.



publicado por JRS às 02:03 | link do post | favorito

Terça-feira, 19.10.10


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Domingo, 17.10.10

Gostei muito do Ao pé da letra do Expresso desta semana. Há muitos meses que leio aqueles aforismos crípticos do António Guerreiro como o que de melhor se faz na escrita de humor em Portugal. Até não entendo, sinceramente, como é que o António ainda não está a trabalhar nas Produções Fictícias.

Gostei porque, pela primeira vez - e sem entrevista na LER - me sinto no "Olimpo do Grande Escritor": fui citado pelo António na sua rubrica! Só tenho pena é que um humorista de tão grande craveira não entenda o que é a ironia. Mas enfim, não se pode ter tudo.

Quanto à etologia: tirei 12. Era uma seca monumental, baseada em contagens estatísticas de groomings de macacos ou sons de gaivotas. Quem percebe alguma coisa de biologia, sabe que a etologia está já um bocadinho desactualizada, que a coisa se baseia muito em ultra-adaptacionismos que o estudo da evolução já ultrapassou há muito. Mas, sendo como é um crítico de renome e um grande humorista, não se pode pedir ao António Guerreiro que perceba alguma coisa de etologia. Eu, como só tirei 12, percebo pouco. Graças a Deus.



publicado por JRS às 04:45 | link do post | favorito

Quarta-feira, 13.10.10

Acabei de saber, pelo Francisco, da morte da Isabel Sousa. Perde-se uma das melhores bibliotecárias do país. Ela e Ana Luísa Ramos fizeram um trabalho de excepção, cada uma na(s) sua(s) casa(s) dos livros.

Conheci-a quando convidou as Quasi para se associarem à Poesia à Mesa, em São João da Madeira. Fizemos um livro em conjunto, levamos lá autores, estivemos presentes (lembro uma sessão admirável com o António Ramos Rosa). Pelo bem público, em parceria desempoeirada com os privados. Sem aquela forma de estar tão políticó-portuguesa de que devem ser os privados a financiar o bem público. (Mas disto falarei noutro post.) Era uma mulher que mexia, que bulia. E já há tão pouca gente neste país com vontade de bulir.



publicado por JRS às 20:29 | link do post | favorito

Este conto, de entre tudo o que escrevi, está entre os textos de que mais gosto. Foi umas das minhas primeiras incursões na prosa. Saiu na tristemente já desaparecida Magazine Artes e depois deu título ao livro de contos que editei na Sextante. Julgo fazer todo o sentido, hoje, colocá-lo aqui. O final faz-me sempre lembrar o meu pai a entrar na cozinha dos meus avós em Ribeirão.

 

Terra

 

Há uma porta que encerra a luz no exterior. E eu entro pela porta entrando na escuridão e abrindo muito os olhos com toda a vontade que tenho de ver. A escuridão tapa-me os olhos e eu aguardo que, um dia, um milagre me deixe sentir no fundo do olhar mais do que estas sombras difusas, mais do que este negrume imenso. E eu entro e entrego a minha alma à luz. Entro com o corpo, só. A alma vive de luz e eu, de qualquer maneira, não necessito dela para onde sigo. Ouço o José, que me acompanha os passos, depois de deixar a alma dele lá fora. Ouço-o dizendo

– Despacha-te, homem.

sempre que o meu andar não obedece às ordens que lhe dou, sempre que o meu andar espera mais um pouco que a alma lhe dê o seu último ânimo.

O José entra atrás de mim, diz

– Despacha-te, homem.

porque o seu vagar ainda tem a luz que, timidamente, consegue entrar no elevador da mina. É uma luz ténue mas que ainda o abraça. Já eu sou muito mais a escuridão que nos irá envolver.

Descemos ao túnel e levamos a vida connosco. Levamos o ar e o sol, a minha mulher, os meus filhos, a mulher dele, o filho às vezes e as árvores. Levamos no retrato que ambos beijamos duas vezes e na cruz em que nos benzemos sempre que entramos. Levamos Deus connosco porque a terra é funda, o céu fica longe. Pensamos às vezes como seria se um de nós morresse enfiado naquele buraco onde passamos os dias, os nossos dias que são sempre noite. Penso sempre: como seria?, estaria Deus disposto a descer àquele inferno para me ir buscar? Um dia perguntei ao José

– Homem, achas que se eu morresse na mina ia para o céu?

estávamos já na mina, naquele carreiro muito escuro que é o túnel, e ele não disse nada. Eu perguntei outra vez, pensando que ele não tinha ouvido por causa do som que a sua picareta fazia, faz sempre, arrastando-se naquela terra que, mesmo já cá no fundo, ainda tenta ver alguma luz

– Homem, achas que se eu morresse na mina ia para o céu?

e ele voltou a não responder. O José não respondeu porque tem um filho que saiu de casa sem lhe pedir a bênção. Ainda hoje, já meses depois dessa pergunta, quando entro na mina com a vida que levo comigo e o José sem o filho que se foi embora, eu penso que ele não respondeu por causa do rapaz.

O filho do José era da idade do meu mais velho. Brincavam juntos em crianças, atirando a terra ao ar e esperando que ela, pelo brilho que os raios de sol lhe dava, caísse em cores e poeira de ouro. Chamavam-lhe ambos as pedras que os nossos pais vão buscar para nós comermos, o raio dos moços. Chamavam-lhe a infância naqueles saltos e naqueles sorrisos, o pó e a terra como um sustento.

Caminharam ambos para a escola, conheceram as primeiras cachopas, enamoraram-se, zangaram-se, fizeram as pazes e pediram para ser como nós. Eu e o José sorríamos pelo exemplo que lhes dávamos e chorávamos muito por saber que o destino dos rapazes havia de ser mesmo esse. Falávamos, como falamos sempre, enquanto o elevador nos leva para aquele inferno, ou à entrada do túnel, onde a terra ainda tenta ver alguma luz, da alegria que era os moços serem como nós e da tristeza de um dia os sabermos falarem na escuridão que era tanto a nossa. Mas era o destino, não havia como. E um destino é uma coisa de Deus, já dizia o senhor padre na missa de domingo. Haviam de ser como nós, de ter mulheres como nós e filhos como nós. De ser felizes na escuridão mesmo que o céu ficasse um pouco mais longe.

Mas um dia o José chegou com o fogo nas ventas a minha casa. Expelia o diabo pelo corpo, tão fora de si estava. Dizia-me a sofrer que o filho se tinha ido embora e que o meu teria culpa nisso. Eu chamei o meu moço e perguntei-lhe uma vez

– Moço, que sabes tu disto?

e ele nada. Como se a picareta do José estivesse a arrastar pelo chão do túnel, parecia não ouvir. Eu perguntei outra vez

– Moço, que sabes tu disto?

já depois de lhe fazer lembrar que era seu pai, pegando no cinto com força e lembrando-lhe muitas vezes, tantas quantas o dito cinto lhe tocou no corpo. Ele chorava, e eu voltava a perguntar com a voz e com as mãos. E ele chorava, e eu perguntava. E ele dizia

– Pai, o filho do senhor José, não sei dele.

como se lhe não soubesse o nome, como se fosse o José quem me fazia perguntar ao meu filho com a voz e com as mãos. Disse muitas vezes

– Pai, o filho do senhor José, não sei dele.

tantas quantas o cinto lhe tocou no corpo. E foi quando já o seu corpo parecia não aguentar mais a minha voz que me falou

– Pai, ele quis fugir, disse que a terra era feita de pó, e não de ouro, que o ouro que via quando atirava a terra ao ar e o sol lhe dava era um engano e que não podia viver a vida dele a procurar um engano metido dentro da terra.

e o filho do José tinha mesmo fugido. E eu fui dizê-lo ao José, não sem antes ter sentido mais uma vez a minha voz e o meu cinto no corpo do meu moço. É assim que se aprende a não guardar a verdade, já dizia o meu pai.

Disse ao José o que ele já sabia. O meu moço, esse, só sabia da terra e do sol e do ouro mas nada do verdadeiro porquê da fuga ou de para onde tinha sido. O José continuava com o diabo a sair-lhe do corpo, com ele fora de si como se de um diabo só se tratasse. Estava capaz de maltratar Deus, se ele lhe aparecesse à frente. Felizmente não apareceu – eu quero ir para o céu com o meu amigo José, e se ele maltratasse Deus ainda ia para o inferno com ele e nós já estamos há muito tempo juntos a trabalhar na mina.

O José saiu de casa com a resignação que lhe consegui dar. Disse-lhe para não se preocupar, que era coisa de criança, que o filho havia de voltar e que depois lhe poderia mostrar com o seu cinto como se tinha sentido na sua falta. Tendo-o acalmado um pouco, fui mostrar ao meu que isso não se faz, precavendo qualquer falta em adiantado.

Os meses passaram e os anos foram muitos meses. Até que um dia o José recebeu pelo encarregado da mina uma carta que tinha um barco e um mar. Vinha destinada a ele e assinada pelo seu filho. A carta dizia assim, como se fosse o filho do José a dizer ao José

– Pai, estou mesmo feliz. Tenho uma terra como a tua, só que é feita de água. Descobri que o ouro que procuras também está na água, e que lá há luz e não há escuridão. Que posso ser um bocadinho tu sempre que entro na água e levo comigo uma picareta, uma lâmpada – como tu, porque não há escuridão mas vê-se mal – e mais coisas, que lá em baixo não há ar. Na mina há ar, pai. Mas não há peixes, pai, peixes que riem para ti quando os caças, coisas velhas que apanhas do chão do mar com uma picareta e que são ouro para quem, como o encarregado da mina a ti, me dá o sustento. Pai, eu estou mesmo feliz, e espero que estejas feliz por mim.

mas não estava. O filho estava feliz, mas longe. E podia ter uma picareta mas não tinha a escuridão para aprender a usá-la só com a lâmpada que da cabeça nos cai. E podia ter o ouro dele mas o ouro dele não era ouro, eram coisas velhas que apanhava do chão e que outros chamavam de ouro. E podia ter terra, mas era água.

O José entrou na mina, desceu o elevador, arrastou-se no túnel, magoado. E, enquanto procurava com a sua picareta o que lhe encomendava o encarregado da mina, enquanto procurava em silêncio comigo ao seu lado procurando o que a mim tinham encomendado, o José continuava triste. Na mina, lá no fundo, quando o inferno é muito quente como só o inferno pode ser e o céu é muito longe, nós trabalhamos sempre com o silêncio junto a nós. Procuramos muito que ele fique sempre connosco, fechando as bocas, pensando nas almas que deixámos lá fora. Mas o silêncio foge em cada golpe que a nossa picareta dá na terra dura que há no fundo da mina e que é já rocha. Mas nós procuramos ainda mais, ficando cada vez mais calados, pensando na alma que ficou lá fora e naquilo que trouxemos para dentro, seja o ar e o sol, a minha mulher, os meus filhos, a mulher dele, o filho – às vezes, só às vezes – e as árvores. Ou no retrato que ambos beijamos duas vezes. Ou na cruz em que nos benzemos.

No dia seguinte à carta, a picareta do José não roçou o chão da poeira do túnel. Ele levantou-a e disse-me que não tinha filho, que aquilo que tinha nascido da mulher dele não tinha nunca existido. Eu perguntei-lhe

– Porquê, homem? Porque matas assim o teu filho? Ele afinal está feliz, não queres ver o teu filho feliz, homem?

e estava, e estava feliz, ou pelo menos assim o fazia notar na carta que enviou e que o José leu como se fosse o filho a falar e a dizer

– Pai, estou mesmo feliz.

dizia lá. O José não respondeu, talvez porque a picareta lhe tenha caído para o chão e começado a roçar a terra e por isso tenha reparado que eu não ouviria a resposta ou então porque a atirou ele. Fiz-lhe esta pergunta durante muitos dias, tantos que até foram dias que foram semanas. E só quando ele teve força para segurar outra vez a picareta é que me disse

– Porque fugiu sem a bênção que lhe queria dar e está à procura de ouro onde não há. Ninguém pode ser feliz procurando aquilo que não existe. 

e não pode, nisso tinha o José razão. Eu não respondi, a força do José aguentou pouco a picareta e ela voltou a roçar o chão do túnel.

Meses depois o José recebeu outra carta. O encarregado da mina, antes de entrarmos, voltou a chamar o José

– José.

e ele voltou a ter de ir buscar a carta. A desconfiança com que pegara na primeira deu lugar à amargura com que se afastou de mim para ir buscar a segunda. Pegou nela sem um sorriso – não que o José seja um homem de sorrisos, mas a força com que o não tinha não dava azo a qualquer dúvida – e abriu-a. A carta vinha também com um barco e um mar nela e endereçada ao José, mas faltava-lhe a assinatura do filho. O José ficou parado, a entender como duas cartas com o mesmo barco e o mesmo mar podiam vir para ele e só uma trazer o nome do filho. Leu-a já a pensar que era outra pessoa a ler para ele, a dizer

– Senhor José, o seu filho que se dizia feliz morreu. Temos muita pena em dizê-lo mas a verdade é esta e nós não temos como mentir-lhe. Também não temos o corpo que era o dele para lhe dar e enterrar onde quiser porque desapareceu na água. Um dia desceu mais fundo do que devia, com a picareta às costas, uma lâmpada – como o senhor José, porque não há escuridão na água mas vê-se mal – e mais coisas, que lá em baixo não há ar. Disse-nos que queria encontrar todo o ouro que conseguisse, as coisas todas que nós lhe pedíramos porque esse era o seu ofício e tinha de ser bom nele. Correu mal a viagem ao seu filho, senhor José, que não voltou do encontro, se o teve. Desculpe lá, mas a vida é assim, só com a morte existe e o seu filho viveu porque morreu. Pelo menos feliz, dizia ele. Sentidos pêsames.

e assinavam algumas pessoas por baixo do nome delas: encarregado, encarregado do encarregado, até o encarregado do encarregado do encarregado assinava. E nós nem sabíamos que havia minas que podiam ter um. Também não conhecíamos as minas de água onde o filho do José era feliz, isso era certo.

E o José entristeceu outra vez. O filho que ele não tinha acabava de morrer. Ou pelo menos assim o dizia o papel. Podia ter morrido há mais tempo, que escrever uma carta, dar a assinar a tantos encarregados e colocá-la nas mãos de um pai demora o seu tempo, mas o José só soube quando a leu e só aí viu o fim do filho na mina de água que era a sua.

O José arrastou a picareta pelo chão meses, tantos meses que foram anos. O meu moço mais velho começou finalmente a acompanhar-nos e o José a chorar em silêncio sempre que o via sozinho, sem a companhia do filho que se tinha ido embora sem a bênção de um pai. Fizemos os três o caminho muitas vezes, descendo o elevador, pelo túnel até ao inferno que é esta mina, desde o sol e da alma que o meu filho também aprendeu a deixar à entrada. Fizemos o caminho e continuámos à procura das coisas que nos encomendavam.

Um dia o José bateu com muita força na terra, tão dura que já era rocha, e abriu-lhe um sulco. Do outro lado do sulco o José viu uma câmara enorme onde cabiam muitos de nós e nela um pequeno rio que corria sobre a terra, límpido, tão límpido que, pensei eu, se alguém ali quisesse nadar não precisava de levar a lâmpada que nos cai da cabeça porque não existia escuridão dentro dele. Ficámos muito admirados, eu e o meu filho, pela descoberta que o José tinha feito. Não era o ouro que nos encomendavam mas era um rio de água limpa a correr no meio de uma câmara enorme. E isso nunca ninguém tinha visto. É certo que tinham falado da água que podia correr em câmaras grandes no meio da terra funda e nós sabíamos que existia. Mas a surpresa não deixou de ser tão grande como a câmara onde cabiam muitos de nós. O rio vinha de longe, aos nossos pés, e passava por nós desde uma fenda também grande na terra até outra grande como a primeira onde desaparecia. Eram fendas grandes também, mas onde só aquele rio acabava cabendo.  

O rio passou a ser um sítio onde os outros mineiros vinham lavar um pouco as mãos da terra que não era tão dura como a rocha e que por isso os sujava. A picareta bate com força na terra que já é rocha e faz dela outra mais mole, que nos entra dentro dos olhos e dos dedos e nos faz sentir com os olhos e com os dedos que o mundo é todo feito de terra. Com a descoberta do José, eu, o meu filho e os outros mineiros, pudemos ver no meio da terra alguma água que nos lavava, por vezes o próprio espírito que tinha ficado à entrada, ao sol, entregue à luz.

E o José batia com a picareta nas imediações do rio. Ele não sorria muito, o José, mas, notava eu, por vezes havia como que um esgar que lhe batia no rosto, da mesma forma que a nossa picareta bate onde queremos que bata. Perguntei-lhe, num outro dia e quando lhe vi esse esgar de um sorriso à entrada do túnel

– Estás mais feliz, homem. Que se passa? É o rio que descobriste que te lava a cabeça das tristezas da vida?      

e o José, mesmo com a picareta dele a roçar o chão e todo o silêncio tão longe porque a picareta não a levantou ele, respondeu baixinho

– Vi o meu filho, homem. Um dia olhei o rio e ele veio à tona da água e olhou a sorrir para mim. Depois as horas passaram muito e foram outro dia e eu vi-o outra vez a olhar para mim e a sorrir. O meu filho descobriu a terra e há-de vir ter comigo pelo meio dela. O meu filho entrou pela terra dentro e agora é parte dela. O meu filho um dia há-de dizer-me o que deve.

e eu não pude deixar de sorrir também. Disse-lhe, com alguma tristeza

– José, homem, bem sabes que a morte não traz ninguém de volta, bem sabes que as pessoas quando morrem são sempre levadas para Nosso Senhor, já diz o senhor padre, e não voltam mais.

mas ele já não ouviu. A picareta começava novamente a roçar como sempre fizera o chão e o José a viver na ilusão de um dia ver o filho a dizer-lhe o que devia.

Passou-se mais tempo, dias que foram semanas, semanas que foram meses. Eu, perguntei-lhe se quando morresse havia de ir para o céu e o José não me respondeu. Desde que disse que havia de esperar o filho dizer-lhe fosse o que fosse que nunca lhe há-de dizer, que me não respondeu a nada que lhe perguntasse. O silêncio era grande, mesmo com o som da picareta arrastando pela poeira da terra que ainda vê alguma luz.

Até que um dia o José parou a picareta na rocha depois de uma pancada ainda mais forte do que aquela com que descobriu o rio. Quando ouvi o silêncio que a falta da picareta do José fez, a bater na rocha ao ritmo que nos encomendavam, voltei-me para ele, parei o meu filho e vi-o a sorrir, feliz.

O José era finalmente feliz. Porque tinha visto água a jorrar num fio, como nunca nenhum de nós tinha visto, da terra que de tão dura já era rocha. O José tinha descoberto o rio, mas o rio vinha de longe e era numa câmara grande e vinha de uma fenda grande e ia-se noutra fenda também grande. Aquele fio de água que jorrava da rocha não tinha de onde vir e existia. O José voltou-se a rir muito e disse

– Vê, homem, podes morrer na mina, que é no meio da terra que está o nosso céu.

porque no meio da terra, descendo pela terra que de tão dura já era rocha, estava desenhado um rosto. O rosto do filho do José que, como ele tinha dito e eu não acreditara, era feito de terra e pelo meio da terra tinha chegado ao José. E que repetia, alto, tão alto que até nossas almas entregues à luz à entrada da mina ouviam

– A sua bênção, meu pai.  



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Hoje na TSF ouvi a senhora do PC (perdão, dos Verdes) a dizer algo de muito interessante: Queremos ver na constituição a salvaguarda ao combate das alterações climática e da biodiversidade. Acho bem. Combater a biodiversidade é algo me deixa muito próximo dos Verdes. A minha posição sobre o assunto até é pública. Viva o PC! (Perdão, os Verdes.)



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Terça-feira, 12.10.10

Depois de uma visita de estudo da turma do colégio ao CCB, com o respectivo piquenique: Pai, não gosto de croissants. Só gosto do que gosto.



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Sobre aquela Pessoa no Chiado: Pai, o senhor Fernando ficou tanto tempo à espera que ficou pedra.

Antes de deitar: Pai, traz o sumo para a cabeça de cabeceira.



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Domingo, 10.10.10

No Terreiro do Paço há uma instalação da Joana Vasconcelos. É uma piscina daquelas que se compram na berma da estrada, azul, claro, feita de plástico. Está ao alto, presumo que a celebrar a República. Mas o que a torna interessante é ter a forma de Portugal.

Minto. O que verdadeiramente a torna interessante é ter profundidade.

Agrada-me a metáfora, que imagino ter sido aquilo em que inspirou Joana Vasconcelos para esta instalação: num país a ir ao fundo, porque não indicar qual a profundidade máxima? E, acreditem, se fizermos uma regra de três simples, ainda estamos a falar em algumas centenas de quilómetros...

A pergunta que fica é: quem deixa de meter água em Portugal?



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Quinta-feira, 07.10.10

Conheço melhor o ensaio de Vargas Llosa do que a ficção. Nas Quasi editei em 2007 Diário do Iraque e Israel Palestina - Paz ou Guerra Santa. Infelizmente, as vendas foram residuais. Dois belíssimos livros, com fotografias da sua filha Morgana Vargas Llosa e que faziam parte do projecto de, na colecção Primeiras Pessoas, editar não-ficção de referência. A Verbo possibilita-me isso, agora. Tenho a certeza que editarei no próximo ano bons títulos de não-ficção.

Tenho pena, não há outro termo senão este, de saber num armazém de Famalicão, e impossibilitados de serem comercializados neste momento, os dois livros. O mesmo aconteceu com o Prémio Sophia de Mello Breyner Andresen ao Manoel de Barros e o Prémio Camões ao Ferreira Gullar. Erros meus, má fortuna... Não consigo deixar de pensar que se não fossem os erros meus poderia nesta altura estar a reimprimir os dois livros - na Babel, no melhor dos sonhos. Mas enfim, fica a consolação de os ter publicado. Espero - e no que diz respeito à Verbo, tentaremos que isso aconteça, posso prometê-lo - que se não esqueçam de dar destaque à não-ficção do Nobel de 2010.

 

   



publicado por JRS às 19:58 | link do post | favorito

Quarta-feira, 06.10.10

Se há um programa que não aprecio é aquele onde durante uma hora ou hora e meia se debate não futebol mas a arbitragem. Digamos que existem níveis de interesse em relação ao desporto que são, para mim, directamente proporcionais com o interesse do programa. No topo está o programa que o Carlos Daniel moderou durante o Mundial (À Noite, o Mundial), onde ele - um profundo conhecedor de futebol - o Carlos Carvalhal - que muito me surpreendeu, e pela positiva - e o Luís Freitas Lobo - que sabe qual o jogador que está a aparecer com dezoito anos na terceira divisão do campeonato boliviano e que certamente daqui a dois anos está num clube europeu (não resisto em lembrar que o Özil, que está no Real Madrid, foi, no primeiro programa, citado por ele como podendo vir a ser a grande revelação do Mundial - e foi) - onde eles, dizia, falavam de futebol a sério como se fosse - e é - um desporto com tácticas, regras, especificidades: no fundo, como se fosse necessário estudar para se saber alguma coisa - e é. Agora, com sinceridade, não sei qual o programa que substitiu este, embora tenha percebido que já não é o Carlos Daniel o moderador (acho). A seguir temos o Bruno Prata e o João Gobern. Gosto muito dos comentários do Bruno Prata; gosto menos dos do João Gobern. De seguida o que junta o Trio de Ataque porque, por vezes, ainda falam de futebol - mas este já leva um suficiente, um três à rasquinha, muitas vezes um dois mais. E depois, com um dois a puxar muito para baixo, o Prolongamento e o inefável O Dia Seguinte. Aqui não há futebol, só à a direcção da Liga, o Conselho de Disciplina não sei de onde, a Comissão de Arbitragem etc e tal. Passam uma hora e meia a debater se aquele lance deve ser para amarelo, vermelho ou azul às pintas. (Aqui não coloco o Rui Santos porque, pura e simplesmente, não compreendo os seus comentários. Aquilo está a um nível tão baixo que o som deve fazer ricochete no meu martelo do tímpano e não me permite a compreensão.)

Mas tudo isto para dizer que segunda-feira vi quase todo o Prolongamento, na TVI. Isto porque, como todos, quis saber qual o raio do penalty que o Villas-Boas dizia existir (e que não existiu). Entretanto, enquanto fazia não sei o quê, fui assistindo às análises do ex-árbitro Pedro Henriques sobre os "lances polémicos". O Pedro Henriques tem o cuidado de dizer a lei do jogo quando ajuíza sobre o trabalho dos colegas, o que ajuda. Mas era preciso é que ajuizasses bem, tendo em consideração a mesma lei. Não o faz. Mas isso interessa-me pouco. O que me interessa é um episódio que merece ser destacado. Vamos a ele.

Os três comentadores residentes são o Francisco José Viegas (acho que veio substituir o Pôncio Monteiro), o Fernando Seara, que só fala por código acerca de nunca se sabe bem o quê, e o desassombrado do Eduardo Barroso que me parece mais, digamos, equilibrado nos comentários (embora, ao lado do Fernando Seara até uma pirâmide invertida parecesse equilibrada...). Foi entre este último e o Pedro Henriques que se passou um dos episódios que mais me fez rir nos últimos tempos na televisão. A certa altura, há uma entrada do Fucille sobre um jogador do Guimarães, que lhe dá o primeiro amarelo. O Pedro Henriques diz que sim senhor, é para amarelo, mas que também poderia não ser, já que ele não entra ao calcanhar. O Eduardo Barroso interrompe-o desde o estúdio do Porto, onde estava, para dizer que aquela entrada é para amarelo claríssimo, se não for mesmo para vermelho, porque lhe toca mesmo no calcanhar. Trinta segundos de discussão, até que o Pedro Henriques sai com esta: "Ó Dr. Eduardo Barroso, eu tive 35 horas de formação em Anatomia Fisiológica e aquilo não é o calcanhar". O Eduardo Barroso disse o que tinha a dizer: "Tem razão, eu sou só cirurgião..."

Depois era vê-los sempre à, enfim, porrada por tudo e por nada. Mas este momento é de antologia. Mais um momento alto num programa onde o futebol não é bem o tema - é mais o pretexto.



publicado por JRS às 21:55 | link do post | favorito

Ora aqui está um excelente exemplo: presidente da Bolívia agride adversário durante um jogo de futebol amigável.

 



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Terça-feira, 05.10.10

Podem ir logo ter ao último parágrafo, se quiserem. Mas não faz mal a ninguém aprender - como eu aprendi - que existe o grafeno. Retirado do Público.

"Imaginemos o traço deixado por um lápis numa folha de papel. Se lhe passarmos a mão por cima, facilmente se esborrata. Acabámos de espalhar no papel várias camadas de grafite, a forma de carbono de que são feitos os vulgares bicos dos lápis. Mas se continuássemos a esborratar o traço a lápis, talvez acabássemos por ter uma única camada de átomos e, então, estaríamos na presença de uma nova forma de carbono — o grafeno.

Foi mais ou menos isto que fizeram dois cientistas, nascidos na Rússia mas a trabalhar no Reino Unido, na Universidade de Manchester, e que resultou na descoberta do grafeno. Até 2004, não passava de uma hipótese, com décadas de especulação. Nesse ano, em Outubro, Andre Geim e Konstantin Novoselov publicaram na revista Science o artigo em que anunciaram a existência real do grafeno e lançaram o entusiasmo na comunidade científica mundial, devido a uma variedade de possíveis aplicações, desde a criação de novos materiais até ao fabrico de electrónica inovadora.
Só que, em vez de espalharem o traço a lápis, Geim e Novoselov utilizaram uma fita adesiva para retirar pequenos fragmentos de um grande pedaço de grafite. No início, os fragmentos retirados tinham muitas camadas de grafite, mas à medida que repetiam o processo, iam-se tornando cada vez mais fininhos. Era a altura de procurar esses fragmentos de grafeno entre as camadas de grafite extraídas.
Tiveram ainda de encontrar uma maneira para que o grafeno saísse do seu anonimato, camuflado entre a grafite, e se desse a ver no microscópio. E o que surgiu foi um material bidimensional (com comprimento e largura apenas, pelo que é plano), quase transparente e que existe à temperatura ambiente.
Esta forma plana de carbono, com a espessura de um único átomo, apresenta-se com o padrão básico do favo de mel, pelo que é ainda composta por seis átomos de carbono ligados entre si. E esses seis átomos ligam-se a outros e a outros, formando uma rede de milhões e milhões de átomos do material que é o grafeno.
Hoje, esta descoberta valeu a Geim, de 51 anos, naturalizado holandês, e Novoselov, de apenas 36 e nacionalidade russa e britânica, o Nobel da Física, no valor de dez milhões de coroas suecas (um milhão de euros). No seu comunicado, a Real Academia das Ciências Sueca justifica a atribuição aos dois físicos “pelas experiências pioneiras sobre o material bidimensional grafeno”.
Aprisionado dentro da grafite, o grafeno só estava à espera de ser libertado, sublinha a informação divulgada pela academia sueca. “Ninguém pensava que tal fosse realmente possível”, lê-se. Muitos cientistas consideravam impossível isolar materiais tão finos, que ficariam instáveis, por exemplo enrolar-se-iam à temperatura ambiente ou desapareceriam.
O novo material libertado não é só o mais fino de todos, é também o melhor condutor de calor. E como condutor de electricidade, é tão bom como o cobre: se for misturado com plástico, pode resistir mais ao calor e ser robusto do ponto de vista mecânico. Também é leve e elástico, podendo ser esticado até 20 por cento do seu tamanho original.
Por todas as suas características, pensa-se que pode vir a permitir o fabrico de novos transístores, mais rápidos do que os actuais de silício, que resultarão em computadores mais eficientes. Ou em novos super-materiais, que os futuros satélites, aviões ou carros incorporarão. Ou em novos ecrãs de cristais líquidos tácteis.

“Estou em estado de choque”, reagiu Novoselov, após um silêncio. “É uma loucura.” Também Geim foi apanhado de surpresa: respondia a e-mails e lia papeladas quando o telefone tocou. “Estou bem, dormi bem, não esperava o Nobel este ano”, declarou depois. “Os meus planos para hoje? Voltar ao trabalho”, garantiu Geim, citado pela AFP. “Há duas categorias de laureados dos Nobel: aqueles que deixam de fazer o que quer que seja até ao fim da vida, o que é um mau serviço à comunidade. E aqueles que pensam que as outras pessoas vão pensar que ganharam por acaso e começam a trabalhar ainda mais.”
Em conjunto, esta dupla trabalha há bastante tempo. Novoselov foi fazer o doutoramento com Geim, na Holanda, e depois seguiu-o para o Reino Unido. Com a física, os dois têm-se divertido, ou não tivessem criado há sete anos uma fita super-adesiva inspirada nas patas das osgas. Antes disso, em 1997, Geim fez levitar uma rã num campo magnético, para ilustrar os princípios da física. Ora, em 2000, a rã que levitava valeu-lhe um IgNobel, prémios para a ciência divertida e inacreditável, “por fazer as pessoas rir primeiro e pensar depois”."



publicado por JRS às 20:29 | link do post | favorito

Segunda-feira, 04.10.10

Vale o que vale, mas fico muito contente de ver, via booktailors, o top de ficção da Almedina assim:

1 Livro, de José Luís Peixoto (Quetzal)

2 O Bom Inverno, de João Tordo (Dom Quixote)

Hoje, quando fui convidado da Prova Oral do Alvim e da Rita, perguntaram-me dos livros e das edições. Disse que já havia gente e viver dos livros, à séria, sem o discurso do coitadinho do escritor que anda sempre a cravar cigarros porque não tem dinheiro sequer para um maço de tabaco. Talvez devido à tal serendipidade, os nomes que citei foram exactamente os do João Tordo e do José Luís Peixoto. Que bom que no top da ficção estejam dois autores portugueses, da minha geração, com livros que sei bons porque sei quem editou um e outro. Parabéns aos dois. Quer dizer: aos quatro. 



publicado por JRS às 22:42 | link do post | favorito

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